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Direito de amar: as lutas e conquistas LGBT+

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Lutando por direitos, quebrando barreiras e conquistando pouco a pouco, o movimento LGBT+  avança rumo a igualdade de direitos. 
Por Juliana Oba e Lucas Ferreira

Em uma sociedade que usa como base uma Constituição excludente, ser diferente pode trazer consequências graves. Pertencer a sigla Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transsexuais e Transgênero (LGBT+) não significa somente enfrentar preconceitos e tabus, mas também estar à margem da lei, não ter acesso a direitos comuns a qualquer outro cidadão e conviver diariamente com atos de violência física e psicológica. Entre todas as dificuldades, ser homossexual é também um fator político, que busca a visibilidade e a representatividade em uma luta que já dura décadas.

 

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Cerimônia de casamento de Janaina Colhado e Barbara Belai (Foto: Michele Chaves/acervo pessoal)

Diferentes formas de violência

Os números são alarmantes e colocam o Brasil no pico dos países mais violentos para a população LGBT+. Segundo dados do Grupo Gay da Bahia, o Brasil é o país que mais mata travestis e transexuais no mundo, diminuindo a expectativa de vida dessa população para 35 anos. Muito menor que a média nacional de 75 anos.

Em 2016, no Brasil foram computadas 343 mortes da comunidade LGBT+, já nos Estados Unidos, no mesmo ano, 77 indivíduos foram mortos, como foi indicado pela Coalizão Nacional de Programas Antiviolência dos EUA.

Além da violência física, a tortura psicológica alcança níveis invisíveis e igualmente brutais. A instituição inglesa PACE divulgou índices alarmantes: 34% da população jovem pesquisada já havia tentado suicídio pelo menos uma vez. O número sobe em indivíduos trans: 48% já tentaram acabar com a própria vida. De acordo com o mesmo estudo, cerca de 57% dos homossexuais já se automutilaram, enquanto mais de 85% de indivíduos transgêneros já fizeram o mesmo.

Um dos grandes problemas envolvendo a violência psicológica, é que ela, muitas vezes acontece dentro de casa e da escola, lugares que deveriam ser de acolhimento e fonte de segurança. Concomitantemente, existem pressões sociais e institucionais cujos danos não entram nas pesquisas e dificilmente são numerados.

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Arte: Lucas Ferreira

Recentemente, uma pesquisa feita pela Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, nos EUA, revelou que mais de 130 mil tentativas de suicídio entre estudantes do ensino médio serão evitadas todos os anos, graças à legalização do casamento gay. O estudo foi feito através da comparação entre as taxas de suicídio antes e depois da legalização no país. Depois da decisão federal, houve uma diminuição de 14% da taxa de suicídios entre a população LGBT+. A pesquisa revela a relevância com que políticas públicas influenciam nossas vidas, reafirmando a importância que o Estado deve ter ao tratar os casos de homofobia. Direitos como o casamento não são uma questão de privilégio mas sim, de igualdade perante a população heterossexual.

Conquistas em favor da vida

A violência não foi capaz de calar o movimento que se espalhou pelo mundo todo. Além disso, alguns países e instituições reconheceram seus erros ao julgar historicamente a população LGBT+. Na década de 1970, a doença saiu da lista de transtornos mentais da Associação Americana de Psiquiatria; em 2015, o Moçambique descriminalizou a homossexualidade em âmbito nacional; a Alemanha em 2016 decidiu indenizar milhares de homossexuais que foram condenados durante o período nazista, sendo centenas deles enviados a campos de concentrações. Esse ano, a Alemanha se tornou o vigésimo terceiro país a liberar o casamento para pessoas do mesmo sexo.

Sobre os avanços no Brasil, Leandro Douglas Lopes, advogado, presidente do Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual de Bauru, vice-presidente da Comissão da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Bauru e Mestre em Direito Constitucional e Especialista em Tutela de Direitos Humanos pela Universidade de Pisa, na Itália, afirma que o casamento foi um dos principais direitos conquistados nos últimos anos, o que acarretou em uma facilidade de adoções por casais homoafetivos. “O uso do nome social para o tratamento de pessoas travestis e transexuais também foi uma inovação, no âmbito estadual, municipal e federal, cronologicamente nesta ordem”, constata ele.

Mesmo com o casamento aprovado, ainda existem alguns entraves, uma vez que não advém de lei federal, mas de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceu como entidade familiar as uniões formadas por pessoas do mesmo sexo. Isso se segue em outras demandas da comunidade LGBT+, pois toda e qualquer proteção ou garantia de direitos à essas pessoas, em âmbito federal, não decorre de lei, mas de decisões judiciais.

Em qualquer democracia consolidada, a maioria não pode suprimir (ou deixar de decidir) os direitos das minorias. Em deferência aos Direitos Humanos, tal como ocorre em outros países, urgente e necessário que a legislação federal seja atualizada. A inclusão do casamento gay no Código Civil, a criminalização da homofobia, entre tantos outros temas relevantes”, ressalta o advogado.

“Entre avanços e retrocessos, o Brasil, de acordo com recente relatório divulgado pela ONU, é um dos países mais homofóbicos do mundo. Neste país, a cada 26 horas uma pessoa é morta por homofobia. As pessoas travestis e transsexuais são as que mais sofrem agressão, segregação e discriminação. Avançamos, mas a população LGBT jamais experimentou da igualdade conclamada na Constituição Federal.” (Leandro Douglas Lopes).

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Arte: Lucas Ferreira

 Os retrocessos continuam. No dia 26 de junho, a Câmara Legislativa do Distrito Federal derrubou o decreto que regulamenta a lei anti-homofobia. A lei já estava regulamentada há 17 anos, e previa multas em casos de discriminação.

Casamento reconhecido por lei

No pequeno espaço do cartório da Rua Antonio Alves, na cidade de Bauru, 40 pessoas se apertavam para celebrar a união de Barbara Belai e Janaina Colhado Gonçalves, no dia 6 de junho de 2015. Alguns anos antes, o sonho de ter o casamento reconhecido oficialmente perante a legislação brasileira não seria possível para elas.

Em 2011, o STF aprovou o reconhecimento da união estável entre duas pessoas do mesmo sexo, tornando o casamento homoafetivo igual ao heteroafetivo perante a lei. Mesmo assim, a lei dava margens para diversas interpretações o que levou a negação de alguns cartórios em realizar a união.

Diante dessa situação, em 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio da resolução 175, decidiu que os cartórios do Brasil seriam obrigados a celebrar o casamento entre pessoas do mesmo sexo ou converter a união estável em casamento.

A oficialização do casamento homoafetivo é uma atitude política de afirmação dos direitos LGBT+. Para Barbara Belai, que sempre teve o sonho de casar, a aprovação da lei foi um passo a mais para dar visibilidade a essas pessoas. “Considero a conquista mais importante até o momento. Vejo como uma forma de reconhecimento e de igualdade. Nossos direitos sendo reconhecidos e legalizados”, relata.

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Janaina Colhado e Barbara Belai oficializando a união perante a lei (Foto: Michele Chaves/arquivo pessoal).

Mais do que reconhecimento, a legalização da união oferece aos cônjuges direitos que vão além do casamento. Previdências, bancos, planos de saúde e seguros, são algumas das consequências positivas proporcionadas pela união entre pessoas do mesmo sexo. “Depois que casei, pude incluir minha esposa em tudo que eu quis, sem a preocupação de aceitarem ou não a inclusão. Por ser cônjuge e tudo estar devidamente legalizado, facilitou bastante as nossas vidas. Consegui incluí-la como minha beneficiária na minha previdência privada, em meu imposto de renda, tudo sem questionamentos”, explica Bárbara, casada há dois anos.

Desde então, o número de casamentos entre pessoas do mesmo sexo vem crescendo cada dia mais, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), esse aumento foi de 51,7% em quatro anos. Segundo os últimos resultados do Instituto, divulgado em novembro de 2016, que compara os anos de 2014 e 2015, os casamentos homoafetivos cresceram cinco vezes mais do que a união entre homem e mulher no mesmo período.

Em números percentuais, a discrepância é ainda mais visível. Enquanto a união entre pessoas de sexos diferentes cresceu 2,7%, em um ano, o casamento homoafetivo cresceu 15,7%. Para Barbara, o aumento foi consequência do reconhecimento legal. “Muitas pessoas já pretendiam casar, mas ainda não podiam por causa da legislação. Acredito que esse número tende a aumentar mais ainda. Conheço um casal de mulheres que estão juntas há 18 anos e só oficializaram o casamento neste ano (2017). Já possuíam a união estável, mas ainda não tinham se casado”, conta.

Caminho livre para adotar

A regularização do casamento homoafetivo trouxe boas consequências para gays e lésbicas que estão planejando começar uma família. Desde 2011, reconhecida como entidade familiar, os casais formados por dois homens ou duas mulheres conseguem adotar crianças de uma forma mais fácil, já que, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) a adoção só é permitida por duas pessoas se elas forem casadas ou em união estável, não citando orientação sexual.

Além desses requisitos, para adotar uma criança no Brasil, de acordo com a Lei 8.069/90 é necessário ter, no mínimo, 18 anos; independentemente do estado civil, ter uma diferença mínima de 16 anos em relação à criança e não ser irmão nem ascendente da criança que será adotada.

Muitas vezes, as pessoas condenam a adoção por pais homossexuais pelo fato de julgarem ser importante para a criança uma figura paterna e uma figura materna. Segundo o psicólogo Danilo de Paiva Negrão, o necessário é apenas uma função materna ou paterna e, não necessariamente, uma figura feminina e uma masculina.

As funções são modelos de cuidado. Resumindo, seria que a função paterna estabelece limites para a obtenção de prazer, nas relações, para os lugares e incluem o social dentro de nós; o cultural; as normas; a moralidade. Já a função materna é aquela que dá sentido às coisas; o cuidado materno; o acolhimento. Essas duas funções podem ser exercidas por qualquer pessoa que tenha se desenvolvido apropriadamente”, explica.

Ainda sobre os modelos de cuidado, por mais que eles recebam nomenclaturas como maternas e paternas, elas não são relacionadas ao sexo. Sendo assim, uma mulher pode exercer uma função paterna e o contrário também é possível.

“Essas funções são captadas através do cuidado, e para cuidar não precisa ser homem ou mulher, basta ser humano, basta ter a sensibilidade para poder cuidar. Essas funções também estão muito relacionadas aos papeis sociais, então você apreende isso do social – ‘não é porque os pais são gays que eu não vou conseguir introjetar uma função materna apropriada’ – muito pelo contrário. No casal heterossexual, às vezes, a pessoa que exerce mais limites é a mãe e a que oferece mais cuidados é o pai, tudo depende de como aconteceu o desenvolvimento desses pais e de quão amadurecido eles são”, completa Danilo de Paiva.

Portanto, é necessário apenas que os adotantes tenham condições psicológicas e sociais para ser pai ou mãe. Sendo assim, o que importa é se a criança irá ser recebida em um ambiente familiar saudável, que favorece o desenvolvimento físico e emocional, sendo isso possível tanto para pais homossexuais ou não. A possiblidade de uma criança ser amada, acolhida e ter um lugar para ela, independente do casal, é favorável à adoção.

Além disso, a adoção por casais do mesmo sexo vem ganhando força no Brasil, uma vez que eles optam por perfis, muitas vezes, excluídos como crianças mais velhas ou grupo de irmãos. Segundo dados de 2016, do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), há 7.158 crianças aptas à adoção e 38 mil interessados em adotar.

Em um país onde a conta não fecha, já que casais formados por heterossexuais idealizam os filhos, ter pais que aceitam amar crianças independente de sua cor ou idade é mais uma prova de que opção sexual nada tem a ver com moral.

A única desvantagem que se vê como possível para uma criança adotada por pais do mesmo sexo são os preconceitos e violência que elas podem sofrer da sociedade, seja pelos professores, colegas ou pais de colegas. Mas esse problema pode ser resolvido pela forma como os pais tratam o assunto.

Tudo depende de como essa criança está sendo educada para enfrentar isso, como os pais apresentam e discorrem sobre esses preconceitos que as crianças podem enfrentar. Se essas questões puderem ser acolhidas pelo casal é bem possível que a criança se fortaleça diante dos conflitos, porque eles surgem mesmo. Se os pais que conseguem trabalhar esse assunto de um modo adequado talvez se desenvolvam uma criança forte”, diz o psicólogo.

 A adoção tem que ser debatida menos em relação à sexualidade dos pais e mais ao valor que a criança adotada vai receber. Independente do casal, qualquer criança em qualquer lar, necessita um ambiente favorável para o desenvolvimento. Um espaço onde ela possa ser desejada, amada, onde possa brincar e receber limites, é fundamental para o crescimento saudável de qualquer pessoa.

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Redação

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