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SAF no Brasil: O título Paulista do Noroeste e os “novos ricos” do futebol nacional

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Entenda como o título paulista do Noroeste pode explicar o sucesso imediato dos clubes-empresa no futebol brasileiro.

Após nove anos de espera na terceira divisão, a A3 do Campeonato Paulista, em 2022 o Noroeste se consagrou campeão e, consequentemente, garantiu acesso para o nível superior. O fato torna-se ainda mais simbólico pois o título veio poucos meses depois do clube de Bauru se tornar uma Sociedade Anônima do Futebol (SAF). 

Jogadores do Noroeste comemoram a conquista do título paulista de 2022. Foto: Bruno Freitas/Noroeste.

Entretanto, para que se possa entender o simbolismo da conquista, deve ser compreendido o conceito por trás da transformação de uma equipe em Sociedade Anônima (S/A).

LEI DA SAF

Em agosto de 2021, foi aprovada no Senado Federal a lei nº 14.193/2021, nomeada Lei da Sociedade Anônima do Futebol, popularmente conhecida como “Lei da SAF”. O projeto permite que os clubes, tradicionalmente associações sem fins lucrativos, possam se transformar em empresas.

No Brasil, a maioria dos times que figuram entre as séries A, B e C do campeonato nacional são associações sem fins lucrativos em formas de estatuto e conselho. Com a transformação em S/A, os clubes poderiam ser geridos como empresas e obterem lucro a partir da atividade futebolística.

O modelo torna-se atrativo para investidores, com o clube podendo ser vendido no modelo de ações, reunindo diversos modos de injetar dinheiro. 

Com a desvalorização da moeda brasileira, os clubes tornaram-se mais atrativos para potenciais compradores estrangeiros. Assim aconteceu com o Botafogo de Futebol e Regatas, do Rio de Janeiro, que aderiu ao modelo de SAF em março de 2022 e logo de cara recebeu um aporte financeiro superior aos R$100 milhões. 

O clube carioca foi adquirido em 90% de suas ações pelo multimilionário norte-americano John Textor, com a promessa de investimento na casa dos R$ 410 milhões. No entanto, com a compra concluída, Textor assumiria todas as dívidas botafoguenses, próximas ao bilhão, segundo balanço publicado pela própria equipe no final de 2020.

A Lei da SAF, no entanto, ainda permite que os novos compradores renegociem as dívidas assumidas, com taxas menores além de prazos flexíveis.

Outro exemplo é o do Cruzeiro Esporte Clube, de Minas Gerais, que oficializou a transformação em SAF no início de abril deste ano. O detentor da equipe mineira foi o ex-jogador Ronaldo Fenômeno, que investiu R$ 400 milhões por 90% das ações do clube, assumindo também a dívida superior a R$ 1 bilhão.

Os valores pagos pelo clube foram vistos como baixos por parte do mercado futebolístico brasileiro. Um exemplo é o do presidente do Athletico Paranaense,  Mario Celso Petraglia, que criticou publicamente as vendas de Botafogo e Cruzeiro: “O que estamos vendo atualmente são os clubes se entregando a investidores por preços absurdamente baixos. É o preço de um jogador”.

O jogador Neymar foi vendido pelo Santos ao Barcelona por aproximadamente R$ 500 milhões considerando a cotação atual (Na época, a venda do brasileiro girou na casa dos 88,4 milhões de euros).

CLAUDIO PRACOWNIK: “A LEI DA SAF É UM MEIO, NÃO UM FIM”

Apontada como solução para os clubes mais endividados, a Lei da SAF não irá solucionar todos os problemas das equipes, principalmente os de gestão. Assim aponta o especialista em negócios do esporte Claudio Pracownik, CEO da Win The Game, consórcio criado com o BTG Pactual para atuar na área do futebol e entretenimento:

“A Lei da SAF abre, de forma positiva, oportunidades de uma nova forma de associação, de recuperação e de reestruturação, mas não resolve o problema estrutural do futebol brasileiro: gestão e governança. Os clubes poderão sobreviver sem se tornarem ou constituírem um SAF, mas não irão sem a implementação de um modelo eficiente de governança e gestão profissional”

O alerta do especialista atenta para o risco de falência dos clubes, que assim como as empresas, em caso de má gestão, também podem quebrar. 

“Se um clube desorganizado vira uma SAF sem um planejamento adequado, ele apenas se torna em uma SAF desorganizada. Com o agravante de pagar mais impostos e incorrer em novos custos”, salienta Pracownik.

“NOVOS RICOS”

Ronaldo Fenômeno tornou-se proprietário da SAF do Cruzeiro em 2022. Foto: Ronaldo Nazário/Twitter.

Com a injeção de dinheiro e renegociação das dívidas, as novas SAF’s tiveram um início animador no modelo de gestão clube-empresa. O Botafogo, recém promovido para a Série A, desembolsou R$65 milhões em contratações para a atual temporada, sendo a equipe que mais investiu na chegada de jogadores em toda a América do Sul. Anteriormente, inclusive, seria quase impossível um investimento tão grande de um clube advindo de alguma divisão inferior. 

Até o momento da publicação, o Botafogo ocupa posição na parte de cima da tabela da primeira divisão do Campeonato Brasileiro, reforçando o projeto de manter-se na Série A e futuramente conquistar títulos.

O Cruzeiro vive situação similar na segunda divisão. Após a queda em 2019, o clube mineiro vive a terceira temporada consecutiva na Série B, mas em 2022 a equipe lidera com folga o campeonato, encaminhando a promoção ao primeiro nível nacional. O bom desempenho deve-se à reorganização interna na diretoria do clube, com a amenização das dívidas e contratação de reforços para o time, justamente alguns meses depois de se transformar em SAF.

NOROESTE E O TÍTULO PAULISTA 

O Noroeste, em nível regional, é outra equipe que vivencia a experiência do clube-empresa. Em janeiro de 2022, a diretoria oficializou a transformação em SAF, juntamente com a divulgação do planejamento para a temporada vigente. 

De acordo com os dirigentes, a conversão do Norusca em SAF viabiliza a atração de investidores externos, auxiliando a equalizar as dívidas, avaliadas em R$ 6 milhões. 

A mudança para empresa deu bons resultados para a equipe bauruense, que 4 meses após tornar-se SAF, conquistou o título paulista da Série A3, consequentemente subindo de divisão, fato que não ocorria desde 2014.

“A SAF não ajudou somente dentro de campo, mas fora também, a estrutura melhorou na questão da alimentação, salário e vivência dos jogadores. Com planejamento para o futuro, na base e no profissional. É uma crescente muito boa”, explica Judá Vitor, lateral e revelação do Noroeste.

Judá em ação pelo Noroeste. Foto: Bruno Freitas/Noroeste EC.

Fato é que as primeiras experiências dos clubes empresa no Brasil, em nível nacional e regional, parecem animadoras. O sucesso imediato de Botafogo, Cruzeiro e Noroeste, trazem perspectivas positivas para os clubes que pretendem virar empresas no futebol brasileiro. No entanto, assim como apontam os especialistas, é necessário o acompanhamento a partir da boa gestão e planejamento para que os frutos se mantenham bem colhidos no futuro, longe de crises internas e financeiras.

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Rafael Nardy Ottoni da Costa

Jornalista em formação pela Unesp, saí de São Paulo rumo à Bauru em busca do sonho de unir o amor ao esporte com a comunicação. Atualmente, sou estagiário de produção na TV Unesp, mas já trabalhei por duas temporadas como repórter acompanhando equipes brasileiras de futebol.

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