O conjunto de obras Carolina Maria de Jesus: um Brasil para os brasileiros está em exibição no Instituto Moreira Salles (IMS), em São Paulo, até o dia 23 de março de 2022. A exposição conta com obras contemporâneas que dialogam com temas abordados por Carolina, como as relações sociais, a ocupação de espaços públicos e o direito à cidade. Artistas que viveram na mesma época da escritora e nomes atuais estão distribuídos por todos os espaços do IMS.
A multiartista Carolina Maria de Jesus é internacionalmente conhecida por sua obra Quarto de despejo, publicada em agosto de 1960, onde a autora faz relatos da favela sobre a favela e de sua vida como mãe solo. Carolina foi uma compositora, cantora e artista circense que retratava em suas obras temas como o cotidiano na periferia e questões sociais do Brasil.
Em cada andar do prédio, cada obra reconta a história do Brasil e desperta a curiosidade do espectador. Bandeiras nacionais resignificadas estão penduradas no teto: uma feita de cobertores de resíduos de materiais reciclados, outra dourada com uma estrela vermelha contendo no centro lábios que representam a negritude brasileira e, por fim, nas cores rosa e verde com os escritos “indios, negros e pobres” em sua faixa branca, a obra de Leandro Vieira para o desfile da escola de samba Primeira da Mangueira em 2019. Bandeiras que exibem o país marginalizado que ainda busca espaço em meio a sua pluralidade.
Uma bandeira feita com 504 esponjas de cozinha usadas, sustentadas por 6 rodos, intitulada Bandeira Nacional (2021), de Desali, sob a frase “…O Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que já passou fome. A fome também é professora.” da obra Quarto de despejo, combinam a exibição da mão de obra de milhares de mães de família que chefiam e sustentam suas casas e a ausência de um governo que saiba das verdadeiras necessidades de seu povo.
Frases da escritora Carolina Maria de Jesus nos halls de escadas despertam a inquietude a respeito da desigualdade econômica e ineficiência política de sua época que percorreu os anos até a atualidade: “O maior espetáculo para o pobre da atualidade é ter o que comer em casa”; “Um homem violento arbitrário e agitador não deve ser eleito para dirigir um país”; “Se o homem tivesse possibilidades de dominar o sol, venderia o seu calor”; “Deus criou o mundo, o homem criou o comércio, surgiu a desigualdade”, dentre outras frases da obra atemporal exibida.
Em vídeo de Maria Clara Villas, o curador da exposição, Hélio Menezes relata que, em trabalho com conselheiros, chegou-se à conclusão de que foi criada uma narrativa de subalternidade sobre a artista Carolina Maria de Jesus, com estereótipos negativos que mostram uma escritora favelada, e que hoje foi ressignificada. Em paralelo, a vaidade e influência da autora foi pouco divulgada na época, cabendo a exposição trazer à tona a mulher excepcional que foi Carolina.
A exposição com curadoria do antropólogo Hélio Menezes e da historiadora Raquel Barreto além de exaltar a imagem e memória de Carolina Maria de Jesus, é carregada de críticas e do desejo de diversos artistas em catalisar a inquietação do público sobre questões ainda vigentes de injustiças sociais, problemas com dimensões políticas, em um país marcado pela manutenção de desigualdades.