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A virtualização dos museus e as mudanças na relação do público com a arte

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Com o fechamento temporário das galerias, a digitalização de obras ganhou uma nova importância em tempos de coronavírus.

Por Gabriel Mello
De nada vale uma obra de arte se ela não é vista por outro senão aquele que a concebeu. O exercício do artista é o de externalizar alguma sensação ou experiência pessoal, isto é, recriar a realidade através da deformação da sua própria matéria, seja pela combinação de cores, de sonoridades, de contornos no mármore, etc. Nas palavras do crítico cinematográfico Michel Mourlet, a arte é “uma chance dada à realidade contingente e inacabada de se locupletar, de um golpe preciso, segundo os desejos do homem”. É claro que busca pela satisfação individual é o ponto de partida que guia o trabalho e sem ela em mente nenhuma obra seria feita. Porém, depois de completa, nada contribuiria mais para o seu potencial do que a sua circulação por entre outras pessoas, pois o poder da arte vem justamente desta comparação entre experiências: da tentativa de identificação com alguém que nasceu do outro lado do mundo e em outra época, mas que permanece vivo por meio de sua criação.
São estas relações que possibilitam um entendimento melhor da existência humana e o museu é a instituição responsável por prolongar pelo tempo e espaço o alcance das obras, com isso, preservando a interação do público com a arte. Já na década de 1980, houve tentativas de potencializar o papel do museu por meio de novas tecnologias, como a criação de CD-ROMs contendo parte dos acervos. Era o começo da virtualização do museu. No entanto, mediante às limitações técnicas da época, o museu virtual estava longe de se equiparar ao real.
No artigo de 1998 “Mídia e Museus: uma Perspectiva do Museu” por Ann Mintz, é dito que a mídia é incapaz de atingir a totalidade da experiência de entrar fisicamente em um museu: “a mídia só pode fornecer informações”. A museóloga complementa que quando se olha para uma obra de arte através de um visor eletrônico, não se nota a textura da tinta; não é percebida a distinção entre as dimensões reais de um quadro ou uma estátua quando estão todas niveladas pelo tamanho da tela digital; a própria paleta de cores do dispositivo não pode reproduzir as tonalidades do mundo.
Porém, com os avanços tecnológicos recentes e, sobretudo, com a Internet, a virtualização trouxe meios inegavelmente mais democráticos de contato com a arte, ainda que ela não reproduza a dimensão metafísica de visitar um museu que Mintz defende. A resolução das telas e a escala de cores aumentam cada vez mais; já existem ambientes virtuais tridimensionais apresentados por óculos de realidade virtual; o acesso à informação contextual sobre as obras é mais imediato.
Nas atuais circunstâncias impostas pela pandemia do coronavírus, com os museus fechados, a virtualização parece ser a solução ideal. A grande questão é se, a longo prazo, a tecnologia conseguirá se fazer invisível, tornando-se um canal pelo qual a relação público-obra se completa espontaneamente, ou se este caminho na verdade afastará a humanidade da experiência natural até que ela desapareça.
O estudante de artes visuais, Pedro Mendes, 25, pensa que nada pode imitar a sensação de estar diante de um quadro real, mas sabe que o museu virtual é muito importante: “É questão de entender que tem gente que nunca vai pisar num museu por motivos financeiros, nem no MASP nem no Louvre”.
Atualmente, uma alternativa para conhecer acervos de museus sem sair de casa é o aplicativo Google Arts & Culture. A plataforma gratuita oferece imagens em alta resolução de peças do mundo todo, mas também disponibiliza outras ferramentas como o Museum View que, aliado a mesma tecnologia do Street View, permite passeios virtuais pelas galerias. Outro recurso é o de apresentar exposições temáticas em que determinadas obras são acompanhadas de textos e vídeos educativos que descrevem o contexto em questão.
Confira alguns museus ao redor do mundo que, por meio do Google Arts & Culture, cederam parcial ou totalmente seu acervo:
MASP – Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (São Paulo, Brasil)
Victor_Meirelles_-_Moema (1)Victor Meirelles (1832-1903). Moema, 1866. Óleo sobre tela, 129 x 190 cm (Créditos: Domínio público/Wikimedia Commons).
O acervo com cerca de 10 mil obras é composto por esculturas, pinturas, roupas, desenhos, entre outros de origem brasileira, africana, européia e asiática. Pela sua proposta de contar a história da arte mundial, a maioria é de nomes europeus como Van Gogh e Cézanne. Porém, vale destacar a atenção à arte nacional com obras bem conceituadas de Di Cavalcanti e Victor Meirelles mas também com trabalhos de artistas menos conhecidos que não faziam parte do circuito acadêmico, como Maria Auxiliadora e Albino Braz.
Museu do Palazzo Vecchio (Firenze, Itália)

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Bronzino (1503-1572). Retrato de Laura Battiferri, 1552. Óleo no painel, 83 x 60 cm (Créditos: Domínio público/Wikimedia Commons).


O interior do Palácio, que foi construído entre 1299 e 1314, abriga um acervo majoritariamente italiano com pinturas à óleo e esculturas de mármore, sendo que o próprio edifício é uma obra a parte, projetada inicialmente por Arnolfo di Cambio. Entre os principais artistas cujas obras decoram o local estão Michelangelo e Agnolo Bronzino.
Museu Nacional de Kyoto (Kyoto, Japão)
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Autor desconhecido. Amida vindo sobre a montanha, século XIII. Cor na seda, 120 x 80 cm (Créditos: Domínio público/Wikimedia Commons).


O foco deste acervo são as obras pré-modernas do Japão, entre os períodos Heian (794-1185) e Edo (1603-1868). Contendo por volta de 12 mil peças que são divididas entre belas-artes, artesanato e arqueologia, a coleção possui esculturas de cerâmica, artefatos históricos, pinturas em seda, mapas, entre outros.
Outra opção é acessar o site do próprio museu. O Metropolitan Museum of Art tem imagens em alta resolução da parte de sua coleção que se classifica como domínio público. Ainda, o site do Louvre oferece passeios virtuais por suas galerias, que estam previstas para reabrir para o público no dia 6 de julho.

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Redação

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