As hidroelétricas representam 90% da fontes renováveis – apesar de limpa, os baixos custos não cobrem os danos ambientais
Por Caroline Braga, Lígia Morais e Marina Spada
Com a conta de luz nas mãos, Osvaldo Ferrari, 62, lê todas as tarifas, porcentagens e valores referentes à energia do mês de julho, em voz alta. “Os impostos já são muito caros e a bandeira vermelha aumenta ainda mais a conta”, reclama o bauruense, que mora no Jardim Ouro Verde. Na casa, ele e a esposa tentam controlar os gastos com medidas práticas: diminuindo o tempo no banho, do uso do ferro de passar roupa, apagando as luzes da sala quando assistem a TV. Porteiro em um condomínio no Jardim Colonial, próximo a Unesp, Osvaldo entrega também para os moradores as contas de energia dos apartamentos, com a mesma informação: “adicional de bandeira vermelha”.
O Sistema de Bandeiras Tarifárias, que entrou em vigor em janeiro de 2015, é aplicado a todos os consumidores e definido mensalmente pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) – antes, os reajustes eram feitos apenas no ano posterior. As bandeiras verde, amarela e vermelha sinalizam os custos reais da geração de energia, que variam dependendo das usinas utilizadas. Como o Brasil é um dos países com maior geração de energia por hidrelétrica, a crise hídrica do ano de 2015 afetou o setor, fazendo com que usinas térmicas mais caras fossem ligadas e aumentando a conta do consumidor com a bandeira vermelha. Em audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais no dia 10, Romeu Rufino, diretor-geral da Aneel, disse que não vê, a curto prazo, mudança da bandeira nas contas de luz.
A dependência desse modelo energético abre o debate sobre a necessidade de investimentos em energias renováveis. O professor Alceu Ferreira Alves, do Departamento de Engenharia Elétrica da Unesp de Bauru e atuante nos temas das energias alternativas, aponta que as mais indicadas seriam a eólica e a solar. Na Alemanha, a matriz já ultrapassa os 50% de energia solar, enquanto que no Brasil, por falta de incentivos governamentais, não há utilização dessa energia em larga escala. O professor chama atenção para o fato de o território estar em uma zona tropical possuir uma grande costa “Poderíamos encher todo o litoral de usinas eólicas e aproveitar muito bem o vento. E quanto à solar; em qualquer região se tem mais sol do que em qualquer país da Europa”, critica.
Para Alceu Ferreira, um dos problemas da energia solar é o silício, já que se vende a matéria-prima bruta e se importa o silício beneficiado por preços muito maiores, o que aumenta os custos da instalação. Segundo a análise do professor, o país ainda não tem a tecnologia de fabricação dos painéis solares, apesar de saber como utilizá-los. Os preços têm caído no mercado internacional por conta do aumento na escala de produção, mas ainda há pouco investimento. Segundo relatatório do Greenpeace, até 2050 poderiam ser economizados US$12 bilhões por ano se direcionasse os investimentos brasileiros em combustíveis fósseis para energias renováveis.
Segundo Alceu Ferreira, não haveria redução no valor da conta de luz com a instalação de energias renováveis: a curto prazo, na verdade, os custos seriam mais altos que os atuais e teríamos “tarifas como as de hoje quando atingirmos um regime de mercado”. Para o professor, é preciso considerar não só fatores econômicos, mas também o ganho ambiental significativo que essas energias trariam.
Proposta na Conferência da França
A Conferência de Mudanças Climáticas das Nações Unidas, COP 21 na sigla em inglês, vai acontecer em Paris entre novembro e dezembro de 2015. Seu objetivo é chegar a um acordo internacional sobre as mudanças climáticas, que deverá começar a ser cumprido em 2020. A COP21 visa substituir o Protocolo de Kyoto, de 1998. Em entrevista para a Agência Brasil, Adriano Santiago, diretor do Departamento de Mudanças Climáticas do Ministério do Meio Ambiente, afirmou que se reduziu em 41% as emissões de gases estufa, entre os anos de 2005 e 2012, enquanto que, nos Estados Unidos, a redução foi de 10%. Para a COP21, a proposta é aderir às energias renováveis de forma que elas representem entre 28% a 33% da matriz energética nacional. A perspectiva é que em 2030 já se tenha 20% de recursos renováveis, além dos recursos hidrelétricos. A porcentagem é o dobro do que se tem.