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Café com afeto e vocação

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A relação do brasileiro com o café, desde a venda até o consumo

Ana Beatriz Ferreira, Bianca Landi e Maria Victoria Mazza

O café, muito utilizado no início de sua descoberta para fins medicinais devido às suas propriedades estimulantes, o café foi descoberto na Etiópia e posteriormente levado para a Arábia. A partir de então em um pulo ganhou o mundo todo, sendo disseminado principalmente pelos holandeses. A primeira cidade brasileira a ter o privilégio de hospedar seu plantio foi Belém, em 1727. No entanto, a cultura não foi muito difundida por lá, e levou quase um século até chegar ao sudeste e tomar o Vale do Paraíba, por volta de 1820, quando então passou a ser um dos nossos produtos de exportação. Em 1845, o Brasil já era responsável pela exportação de 45% do café, conquistando o título de maior produtor mundial.  

A importância econômica e social do café para o Brasil é tamanha que por vezes a história do seu desenvolvimento em terras tupis se confunde com a própria história do país após a colonização. O “Ciclo do Café” tem grande relevância e é ensinado aos brasileiros desde os primeiros anos de escola. Esse período gerou muito crescimento para o país, possibilitando o desenvolvimento e a industrialização de diversas regiões brasileiras, principalmente nos estados de São Paulo e Paraná, com a criação da rede ferroviária, asfaltamento de estradas e energia elétrica, por exemplo.

O Brasil é atualmente o maior produtor mundial de café, responsável por 30% do mercado internacional, e o segundo mercado consumidor, ficando atrás somente dos Estados Unidos. A produção anual de café nos últimos 35 anos no Brasil foi de 23 milhões de sacas de 60kg de café beneficiado. O consumo per capita nacional alcançou a marca de 4,5kg na década de 1970 e após queda na última década e apesar da crise, vem se recuperando: em 2015 o consumo foi de 4,9kg/habitante/ano.

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Algumas marcas trazem uma diversidade de sabores regionais para a casa do brasileiro. Foto: Maria Victoria Mazza

Isso se deve ao fato do café ser um item importante e muitas vezes essencial no cotidiano dos brasileiros. Cada vez mais as pessoas têm procurado por variedades devido a um movimento natural de valorização da qualidade e da certificação do produto. A percepção sobre a qualidade e as diferenças entre cafés está se aprimorando entre os consumidores, o que tem aumentado o consumo em monodoses e a procura por cafés gourmet, que até pouco tempo não eram tão conhecidos mas que agora parecem ser a tendência dos apreciadores de café para o futuro: 37% dos consumidores já identificam os cafés tipo gourmet, e 44% do público se mostrou disposto a pagar a mais por eles, desde que reconheçam uma qualidade superior. Os dados são de uma pesquisa feita pela Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC), em 2014.  

Diante desse cenário, a profissão que envolve a especialização na área do café tem se mostrado promissora no Brasil, e não só pelo aumento crescente do consumo de cafés especiais, mas também pela carreira em si, que possibilita ao profissional ter sua própria marca de café ou cafeteria. No mundo do café as especializações podem ser: Produtor, Degustador, Q-grader, Classificador, Mestre de Torra e Barista.

A barista, cafeóloga e pesquisadora da história do café, Moni Abreu, explica que ainda não há no Brasil cursos completos voltados para a especialização na área: “para formação valemo-nos apenas de cursos livres espalhados pelo Brasil por pequenas instituições e empresas independentes”.

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Infográfico: Ana Beatriz Ferreira

É o caso da Casa do Baristafundada por Emilio Rodrigues no Rio de Janeiro em 2005, uma escola de formação que oferece cursos de baristas e latte art, figuras artísticas feitas na superfície da bebida. Ele relata que o público pode variar “desde apreciadores de café em busca de conhecimento sobre a bebida, pessoas que têm ou querem ter uma cafeteria ou algum negócio relacionado ao café e pessoas que querem ser Baristas”. Além disso, há também grande procura por parte daqueles que pretendem tentar a sorte em outros países, como Colômbia, onde o café e a profissão têm mais reconhecimento, segundo ele.

Para o profissional, o Brasil ainda é muito limitado no que diz respeito ao crescimento do segmento de cafés especiais devido à lógica protecionista, que impede a importação de grãos verdes (antes da torra): “estamos ainda reféns de uma lógica antiga, equivocada, mas muito arraigada no Brasil e bastante lucrativa para alguns, voltada a atender os interesses externos ao país e destinando aos brasileiros apenas aquilo que não pode ser exportado”.

Emílio diz que isso impede também o grande público de apreciar cafés de outros países. Ele explica que todos os cafés, qualquer que seja sua origem, depois de torrados acabam oxidando, o que faz com que percam suas propriedades, tanto de aroma quanto de sabor. Moni também acredita que o erro está em o foco de a produção no Brasil se manter na quantidade, lucro e exploração em detrimento da qualidade, cultura e diversidade dos grãos. “Os produtores são deixados à própria sorte, acabando muitas vezes cometendo erros clássicos repetidos desde 1800. É assim que a qualidade média do Brasil acaba sendo bem ruim, muito atrás da qualidade média por exemplo da Colômbia, país infinitamente menor que o nosso, mas que tem amplo reconhecimento mundial em sua qualidade, pois é focado em produção de qualidade”, explica.

São por essas questões, segundo a barista, que a especialização na área acaba limitada. Ela diz ainda que o café tradicional, que é facilmente encontrado em mercados, “é um problema de saúde pública, afinal é um produto oriundo do excesso de produção nacional, portanto, de baixa qualidade e sem nenhum efeito nutricional. Infelizmente é esse que está em todos os lares brasileiros e sendo servido em todos os cantos do país”.

Consumo e produção: os hábitos do brasileiro

A relação do brasileiro com o café vai muito além do simples hábito de ingerir a bebida. Ele está muito presente no nosso dia a dia e não necessariamente isso acontece devido aos nossos altos índices de produção.

Um relatório preparado pela Euromonitor Internacional para a ABICem abril de 2016, comparou o consumo de café em nosso país com outros produtos: em 2014, a bebida representou uma venda de 28,1 bilhões de litros. Com esta estimativa, em 2019 a espera é que chegue a 32, 5 bilhões de litros.

Para Edgard Bressani, diretor da Capricornio Coffees, o consumo de café pode ser explicado, além do apelo emocional, pela variedade de sabores e preços. “É claro que há café para todos os bolsos. E quando a crise aperta, as pessoas mudam para as opções mais baratas”. Uma alternativa encontrada foram as cápsulas que, segundo ele “se espalham para muito lares por não serem tão cara e por sua praticidade de preparo, opção de provar cafés diferentes e preparo de bebidas com leite em algumas versões”.

O relatório desenvolvido aponta que o uso de cápsulas deve dobrar até 2019. Em 2014, o consumo de café em pó foi de 81,44%, ainda como primeira opção para a bebida, grãos torrados foi de 17.99% e as cápsulas ficaram com 0,6%, totalizando um consumo de 980 mil toneladas. A projeção para 2019 é que o café em pó caia para 80,4%, o café torrado vá para 18,52% e cápsulas chegue a 1,1%, totalizando um consumo de 1,126 toneladas.

A pesquisa ainda revela que a preferência pelo café em pó se dá pelo fato de que sua penetração nos lares é maior e também está ligada a praticidade e costume. Os grãos, por sua vez, ainda apresenta baixa incidência nas residências, uma vez que seu preparo depende de máquinas. Com isso, “a tendência é que a participação desse formato cresça através da maior oferta de grãos especiais/gourmet”.

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O café em pó  preparado em casa  ainda é preferência nacional. Foto: Maria Victoria Mazza


E por falar em café especial, Edgar acredita que esse é um dos motivos para o impulsionamento do consumo, com um crescimento de 15% ao ano, assim como um maior cuidado dos baristas e uma tentativa de oferecer uma qualidade melhor da bebida. “Mais cafeterias, pelo menos nas grandes e médias cidades, estão fazendo um trabalho diferente. Promoção importante da ABIC no passado com o Selo de Pureza e o Selo de Qualidade. Hoje várias cafeterias no Brasil compram lotes bons, lotes de concurso.”

Em relação ao perfil do consumidor, a Euromonitor realizou uma pesquisa em novembro de 2015 e constatou que o consumo médio de bebidas fica de 3,7 e 3,6 xícaras por dia, entre homens e mulheres respectivamente. Quando pensamos em idade, o maior consumo se encontra na faixa-etária superior a 60 anos e a menor incidência se dá entre 16 e 20 anos, isso se considerarmos o consumo diário do café.

Já entre a preferência, os cinco primeiros são o café puro de coador, seguido pelo café expresso, café com leite, cappuccino e café solúvel. Já sobre o lugar onde a bebida é consumida, 61% é dentro de casa e 38% fora dela e isso se deve, principalmente, ao fato de que o consumidor “prefere métodos mais práticos e eficientes”.

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Profissão: barista

Se o consumo é grande, o interesse por uma maior especialização sobre o café também é. No Brasil, existem cursos, premiações e até uma Associação Brasileira de Café e Barista, a ACBB. Porém, a especialização nem sempre é a maior preocupação de quem quer abrir um negócio relacionado à café. Bressani revela que “muitos estabelecimentos não investem em treinamento. É uma pena. Com conhecimento poderiam servir um café muito melhor. E qualidade está diretamente ligada a aumento de consumo”.

Porém, aqueles que se interessam, podem encontrar boas especializações para desenvolver o gosto e a prática pelo café. Edgar explica que existem muito cursos e que eles são uma boa oportunidade para aprender mas que ainda “há muito o que se fazer”. O profissional, que escreveu o livro “Guia do Barista”, com muitas dicas e técnicas para quem se interessa pelo assunto. Ele acompanha o trabalho desde 2002, quando ministrou o curso para 10 turmas, um momento que a profissão ainda era pouco conhecida.

Apesar da queda de qualidade e consumo que já chegou a ocorrer dentro do nosso país, a  valorização da bebida tem se tornado modelo de consumo por outros países. Edgar Brassani conta que México, Índia e Indonésia, por exemplo, possuem uma espécie de “Case Brasileiro” para impulsionar e promover o consumo do café nessas regiões.

O café faz parte de nossa cultura, se alastrou pelo Brasil e ficou. Hoje é um hábito enraizado em nossa cultura e o trabalho dos baristas e da qualidade no café serão fundamentais para atrair a atenção dos jovens que começam pelas bebidas à base de café – cappuccinos, coffee shakes e todos os drinques deliciosos que levam café para mais adiante passarem a tomar expresso, café filtrado, etc.”

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O capuccino, uma das variações mais apreciadas. Foto: Maria Victoria Mazza

Patrimônio cultural do Brasil e o Museu do Café

Durante o período de maior prosperidade do Brasil com a exportação cafeeira, no auge da produção de estados como São Paulo e Minas Gerais, a cidade de Santos recebia parte das sacas que seriam enviadas a outros países através de seu porto.

Na Bolsa Oficial do Café, edifício tombado pelo Instituto Histórico e Artístico Nacional, Iphan, desde 2009, localizada em um palácio no Centro Histórico da cidade, eram ocorridas as negociações e pregões voltados a determinar as cotações diárias do grão.

De atuação decisiva na economia nacional, a construção, no dias atuais, é um importante ponto turístico santista. Hoje, além disso, abriga o Museu do Café, referência que busca contar a seus visitantes a trajetória deste elemento de nossa cultura, bem como reforçar a procura por uma bebida de mais qualidade, obtida do alto conhecimento de baristas e demais especialistas em seu preparo

No local, há visitas monitoradas com grupos escolares e turistas que se encerram com momentos de degustação na cafeteria do Museu. Tudo voltado especialmente à apreciação do “ouro verde”. Os interessados podem ainda encontrar produtos para preparar o seu café em casa, com elevado grau de refinamento, de excentricidades como o café de Jacu, um grão de valor elevado, vindo do Espírito Santo, cuja embalagem chega a custar mais de R$ 200. A justificativa é o processo de obtenção: retirado diretamente das fezes da ave jacu, esta tem o olfato apurado e é capaz de escolher os grãos com maior grau de maturação.

Além disso, o Museu do Café tem uma grade de cursos oferecidos pelo Centro de Preparação de Café, que preparam mais profissionais para o mercado. Karina Frey, profissional da equipe de Comunicação do Museu, afirma que “na Cafeteria do Museu, bem como durante as atividades do nosso Centro de Preparação de Café (CPC), percebemos o interesse do público em desvendar ou desmistificar questões essenciais para o preparo de um bom café, bem como o interesse em descobrir diferentes tipos de grão para que seja possível encontrar o prazer no consumo”.

No curso de baristas, há espaço para teoria, prática e abordagem científica, fazendo com que a técnica crie profissionais qualificados. Entre o público interessado, observam-se diferentes faixas etárias, todavia principalmente jovens que visam a seguir a carreira ou empreender em seu próprio negócio.

De acordo com Karina, o Museu trabalha com a ideia de que o café deve ser apreciado conforme sua importância enquanto patrimônio cultural brasileiro, conhecimento, arte e história. Para ela, “o café está presente em diversos momentos da vida do brasileiro, ele reúne amigos, família, é procurado em momentos específicos, é ‘aliviador’ para muitos, potencializa e energiza outros, o aroma e o sabor é transformador e mexe com muitos sentidos, ou seja, é uma plena aceitação e querer do café na rotina, no lar, no trabalho e como razão para estar com quem se gosta, para um programa ou um momento especial. ”

Ficou curioso?

O Museu do Café fica em Santos, no litoral de São Paulo, e conta com um Núcleo Educativo que realiza visitas monitoradas com agendamentos, além de trabalhar com horários específicos para visitas espontâneas, a quem quiser conhecer e depois, quem sabe, degustar um bom cafezinho.

Rua XV de Novembro, 95 – Centro Histórico

CEP: 11010-151 – Santos – SP

Fone: (13) 3213-1750

E-mail: museudocafe@museudocafe.org.br

Redação

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