Barbara Pinela, Mariana Hafiz e Thainá Zanfolin
Em 2016 foram registrados 66.597 embriões congelados no Brasil em clínicas de Reprodução Humana Assistida, de acordo com 10º Relatório do Sistema Nacional de Produção de Embriões (SisEmbrio). Este número espelha o aumento de busca de ajuda médica no momento de conceber um filho, cada vez mais frequente na realidade dos brasileiros. A quantidade de embriões congelados em 2016 é o dobro daquele registrado em 2012, quando era marcada a margem de 30 mil embriões.
O gráfico 1 exemplifica a distribuição de embriões congelados no ano de 2016 no Brasil. Dos 66.597 embriões congelados no ano, mais da metade estão na região Sudeste do Brasil.
O gráfico 2 compara, entre os anos de 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016, o total de embriões congelados no país. Nota-se um crescimento entre os anos de 2012 a 2015 e uma leve redução nos números referentes a 2015 e 2016.
Existem diferentes técnicas e tratamentos quando se trata da ajuda que uma clínica pode oferecer a seus pacientes. Entre elas estão a relação sexual programada, inseminação artificial, fertilização in vitro, fertilização in vitro com injeção de esperma, fertilização in vitro simplificada, doação de óvulo, espermatozoide e de útero e diagnóstico pré-implantacional. Bruno Scheffer, diretor clínico do Instituto Brasileiro de Reprodução Assistida, explica como cada uma delas acontece e o que envolvem.
Relação sexual programada
É o método no qual se realiza um tratamento hormonal que estimula a ovulação, com os hormônios folículo-estimulante (FSH) e luteinizante (LH), e que implica exames de ultrassonografia para observar o tamanho do Folículo de Graaf – uma espécie de bolsa que protege o óvulo enquanto ele se desenvolve. Quando ele atinge 19mm, a mulher toma uma injeção de HCG – hormônio que promove a maturação do óvulo e sua liberação – e deverá ter relações sexuais com o parceiro em 36 horas.
Essa técnica é recomendada para casais que tenham dificuldade de engravidar sem causa aparente, mas deve-se manter em mente que a probabilidade de sucesso é baixa, variando de 13% a 17%, de acordo com a idade do casal.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Comitê Internacional para Monitorização da Tecnologia de Reprodução Assistida (ICMART) disponibilizam um glossário, assim como o fez o site Fertilidade.
Inseminação artificial
Neste procedimento o esperma é recolhido e passa por um tratamento.
“No tratamento, fazemos uma filtragem, com os espermatozoides com formato e movimentação normal”, conta Bruno.
Eles são injetados no útero através de um cateter. Em alguns casos, o tratamento é acompanhado do uso dos hormônios FSH e LH. O uso destes hormônios pode aumentar as chances de se ter gêmeos em até 10%.
O processo, desde a coleta do esperma até a injeção no corpo da mulher é muito rápido, durando cerca de 40 minutos. Quando não há a indução de ovulação, as chances de sucesso são de 17%. Quando há a indução, essa taxa sobe para 30%.
Fertilização in vitro
Aqui, a mulher recebe doses dos hormônios FSH e LH durante sete a dez dias para que a ovulação seja estimulada. Quando os folículos de Graaf chegam aos 19mm desejados, uma espécie de agulha é inserida através da cavidade vaginal e realiza a aspiração dos óvulos.
Os óvulos são então colocados em placas de vidro, juntando-se aos espermatozóides coletados e selecionados conforme formato e mobilidade uma hora antes. Um espermatozóide entra no óvulo, como aconteceria no corpo da mulher e após entre dois e cinco dias, os embriões são injetados no corpo dela.
Dependendo da idade da mulher, a quantidade de óvulos injetados varia: até 35 anos, são inseridos dois embriões. O número sobe para 3 quando se tem entre 35 e 40 anos e para 4 dos 40 aos 50 anos.Este tratamento conta com taxa de sucesso entre 40% e 63%, de acordo com Bruno.
Fertilização com injeção de esperma
Quando a taxa de espermatozóides está abaixo de 1 milhão (o normal é de, pelo menos, 5 milhões), apenas 35% apresentam mobilidade normal ou apenas 5% de células apresentam o formato desejado, a injeção intracitoplasmática de espermatozóide (ICSI, na sigla em inglês) é realizada, conforme recomendações médicas.
O médico realiza uma seleção de espermatozóides e, quando o médico encontra um que tenha ambos mobilidade e formato dentro dos padrões, ele o absorve com uma agulha e o injeta dentro do óvulo. Insere-se, então, o embrião no corpo da mulher da mesma forma que se faz na fertilização in vitro tradicional. Aqui, a probabilidade de êxito também é semelhante: de 40% a 63%.
Fertilização simplificada
Bruno explica que quando um casal tentou a fertilização in vitro (FIV) comum e não obteve sucesso, eles podem então tentar a fertilização simplificada. A diferença consiste no método de injeção de hormônios para estimulação da ovulação: enquanto o método comum se utiliza de injeções hormonais, na fertilização simplificada isso é feito através de comprimidos.
Essa não é a única diferença, entretanto. Aqui, a quantidade de embriões recolhidos é menor; enquanto a FIV clássica recolhe todos os óvulos disponíveis, a simplificada recolhe apenas até 4. Em relação aos processos de fertilização e implantação do embrião, esses acontecem da mesma forma em ambas FIV clássica como na simplificada. Como a quantidade de óvulos utilizada é menor, as chances de concepção também diminuem, chegando a 15%.
Doação de óvulo
Essa técnica é utilizada como solução para a interrupção precoce do funcionamento dos ovários, que ocorre quando uma mulher adia a gravidez durante muito tempo. Aqui, uma doadora desconhecida cede seus óvulos a uma clínica e eles poderão ser fecundados para serem inseridos no corpo da receptora. Esta, por sua vez, toma hormônios que preparam seu corpo para receber o embrião, que foi fecundado no mesmo processo da FIV clássica, com o sêmen do marido/companheiro. Insere-se, então, o óvulo através de um cateter e as chances de engravidar chegam a 50%.
Doação de espermatozóide
Pode acontecer do homem ter completa ausência de espermatozoides, então o casal pode comprar uma amostra de sêmen em um banco de esperma. A fecundação pode ser realizada in vitro ou através de inseminação artificial, de acordo com a fertilidade da mulher. Quando a idade da mulher é menor de 35 anos, as chances desse procedimento dar certo são de até 50%.
Doação de útero
Este método é utilizado em caso do útero da mulher não possuir condições de manter o embrião, no qual é realizada uma fertilização in vitro usando o óvulo da mulher e o espermatozóide do homem, e o embrião é implantado em um útero emprestado. As chances de êxito com essa técnica são de até 50%, baseando-se na idade da mulher.
Diagnóstico pré-implantacional (PGD)
Quando o casal apresenta doença genética, cientistas podem realizar um exame, procurando os embriões saudáveis. Bruno explica que é feita a fertilização de todos embriões seguida pela retirada de uma célula de cada um, para uma análise de seus genes. Se não houver problemas, o embrião é injetado no corpo da mulher, mas se apresentarem problemas genéticos, eles não podem ser descartados. Ao invés disso, são congelados e poderão ser usados em pesquisas futuras. Assim como as outras técnicas de FIV, a taxa de sucesso com o PGD varia entre 45% a 63%.
“O preço também pode variar de cidade para cidade. Um tratamento em São Paulo custa mais caro que o mesmo aqui em Belo Horizonte”, comenta o Bruno Scheffer. Ele explica que a reprodução assistida é cara por se tratar de um procedimento de alta tecnologia.
Investimento
Bruno ainda afirma que o meio de cultura onde os embriões se desenvolvem, por exemplo, não é barato. Os profissionais que a realizam passam por um processo de treinamento e há ainda o alto custo dos medicamentos. Os hormônios mais baratos custam em média R$ 100. Os mais caros, podem chegar a R$ 5 mil.
Primeiros Passos
Antes de qualquer um desses procedimentos acima serem feitos, é necessário realizar uma série de avaliações para definir quais são as dificuldade e problemas orgânicos e hormonais que envolvem a infertilidade. Os exames que precisam ser feitos pela mulher, mais especificamente, são o ultrassom transvaginal e a avaliação de perfil hormonal, que servirão para avaliar a reserva ovariana, além da histerossalpingografia, exame que avalia as trompas uterinas a partir de um raio-x com contraste.Os homens devem fazer o espermograma para identificar possíveis anomalias na produção ou mobilidade dos espermatozóides.
Além destes, ambos devem realizar teste de hepatite B e C, de HIV, HTLV, sífilis e rubéola, além de exames de sangue para compreensão das causas genéticas. É a partir dos exames que se determina qual tipo de procedimento é mais suscetível ao sucesso.
Confira o que constitui realizar uma FIV:
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Riscos para Mãe e Bebê
As gestações advindas de um procedimento de reprodução assistida têm maiores chances de serem múltiplas (com mais de um bebê), uma vez que há a estimulação da produção de mais óvulos do que ocorre naturalmente ou a implantação de mais de um óvulo na mulher. Estas práticas são realizadas para aumentar as chances de sucesso, mas podem acarretar em problemas para a saúde do bebê e da mulher.
Em 2008, foi publicada uma pesquisa responsável por apontar que a maior parte dos bebês de gestação múltipla nascem prematuros, o que aumenta a chance do aparecimento de problemas respiratórios, distúrbios metabólicos e até doenças neurológicas. A prematuridade no nascimento causa diminuição no peso do bebê e alguns tumores infantis passam a ser mais comuns em crianças que nascem com peso menor, como é o caso do hemangioma. A incidência desse aumenta em 30% a cada 500 gramas abaixo do peso, conforme explica Dev Goldenberg, médico responsável pela cirurgia plástica pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
De acordo com dados do DataSUS referentes a 2015, o hemangioma atinge cerca de 5% dos nascidos vivos no Brasil, percentual que representa 150 mil bebês.
No caso das mães, os quadros clínico analisados na pesquisa mostraram que a maioria das mulheres tiveram algum problema durante a gestação, anemia ou rompimento das membranas amnióticas de forma prematura. Além disso, considerando que a maior parte das mulheres que fazem o procedimento são mais velhas ou tem passado obstétrico desfavorável, as chances de haver complicações como pré-eclampsia ou deslocamento prematuro da placenta aumenta.
Para controlar o número de gestações múltiplas com mais de 2 bebês, no Brasil só é permitido a implantação de, no máximo, 4 óvulos por procedimento.
Procedimento Gratuito pelo SUS
Desde 2012 os procedimentos de reprodução assistida podem ser feitos pelo Sistema Único de Saúde. Hoje, apenas nove instituições realizam este procedimento, mas nem todos são 100% gratuitos, já que alguns medicamentos utilizados para o tratamento podem ser cobrados dos pacientes.
Marilena C. D. V Corrêa e Maria Andrea Lyola, em artigo publicado em 2015 nomeado como “Tecnologias de reprodução assistida no Brasil: opções para ampliar o acesso”, as pesquisadoras apontam a existência de uma exclusão do acesso às técnicas de reprodução assistida por parte da população mais pobre que não poderia arcar com os gastos. Durante o texto, elas apontam as problemáticas que envolvem o procedimento feito pelo SUS, uma vez que muitos hospitais não cobrem todos os custos, assim como alguns deles, segundo o texto, não tiveram sucesso em um número expressivo de procedimentos em um longo períodos de tempo.
Na América Latina
O primeiro nascimento fruto de fertilização com métodos de reprodução assistida na América Latina aconteceu na Colômbia por meio de fertilização In vitro, em 1984. Logo após, esta e outras técnicas começaram a se expandir para o restante dos países. Assim, dentro do continente a matéria tem sofrido mudanças frente avanços científicos e tecnológicos, como também cada país delimitou termos legais e de saúde para desenvolver as fertilizações.
O cenário é diferente em cada país, cada um deles tem apresentado avanços em diferentes magnitudes no que diz respeito à reprodução assistida.
Argentina
Desde o ano 2013 se tem “acesso gratuito e integral a qualquer tipo de tratamento e procedimento médico de reprodução assistida para toda pessoa maior de idade, que expresse seu consentimento informado,revogável até ser feito a implantação do embrião na mulher”. (Lei 26.529, direitos do paciente em relação com os profissionais e instituições)
As técnicas são disponíveis para a casais homoafetivos ou heteroafetivos, que não precisam estar casados. e para homens ou mulheres que não são tem laço afetivo algum, que possuam ou não algum problema de fertilidade. Mas o decreto também regulamenta que cada pessoa pode aceder a um máximo de 3 tratamentos de baixa complexidade e 3 de alta, tendo em consideração que a pessoa se deve submeter primeiro aos de baixa e depois partir para as de maior complexidade, caso a primeira não der certo. Isso deve acontecer respeitando um intervalo de no mínimo 3 meses entre cada um.
Uruguai
A realidade no Uruguai é bastante parecida à argentina em vista dos processos de reprodução assistida com a criação da lei de Reprodução Medicamente Assistida, em junho de 2013. A norma tem o mesmo objetivo da normativa argentina: garantir acesso integral a procedimentos deste tipo realizados pelos “estabelecimento sanitários habilitados que cumpram com os requisitos que as autoridades determinaram”.
Chile
Em contraste com a panorama argentino e uruguaio está o Chile, onde a situação é diferente; a maioria das pessoas que se submetem a alguma dessas técnicas precisa de maior capacidade financeira para realizá-las, pois o financiamento por parte do Estado é mínimo. No Chile existem sete centros de reprodução assistida dos quais cinco são privados e os processos realizados são, em sua totalidade, financiadas pelos interessados, pois os dois sistemas de saúde do país – Fundo Nacional de Saúde (FONASA), braço público do sistema, e as Instituições de Saúde Previsional (ISAPRE), suaporção privada – não oferecem o financiamento necessário.
México
O caso mexicano é mais complexo. A nação não tem uma legislação que regulamenta esses processos e conta apenas com duas associações médicas nacionais e internacionais: Associação Mexicana de Medicina da Reprodução (AMMR) e a Rede Latinoamericana de Reprodução Assistida (RedLara). Estas são os únicos organismos que registram a informação e fiscalizam os processos realizados dentro do país. O quadro, entretanto, não supre as necessidades implicadas por um país tão grande quanto o México.
“Um dos maiores problemas que existem em países como México, que não tem uma regulação forte e supervisão nenhuma é que se convertem em potencial de abusos, riscos e fraudes”, comenta José Antonio Alonso, médico geneticista e especialista em bioética da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM).
No Futuro
O desenvolvimento das técnicas de FIV se deu a partir do desenvolvimento de técnicas de refinamento e dos meios de cultura embrionários, assim como a transferência adiantada de embrião, a redução do número de espermatozóides utilizados e melhorias nos equipamentos.
Mas, ao mesmo tempo em que as técnicas já conhecidas foram sendo aprimoradas, novas técnicas também foram sendo criadas. As pesquisas em torno do tema giram em torno do estudos das causas da infertilidade, assim como a melhoria das técnicas. Alguns trabalhos apresentados no 23º Encontro Anual da European Society of Human Reproduction and Embryology, há 10 anos, passaram a enfatizar a criopreservação de gônadas, o que possibilitaria que mulheres com mosaico da Síndrome de Turner pudessem realizar o procedimento.
Fontes utilizadas e referências.