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O prazer em rede: A internet revolucionando a sexualidade

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Como a internet tem revolucionado o mercado, o sexo e os relacionamentos
Por Daniele Fernandes e Juliana Gonzalez

Todos os seres sexuados precisam ter alguma motivação para se envolver sexualmente. Nos animais, é instintivo, basta ter um estímulo e terá uma resposta. O ser humano também é um animal que segue seu instinto, porém desenvolveu uma habilidade cognitiva que interfere na sua sexualidade. Tudo o que permeia a atividade humana é carregado de significado, e no sexo isso não é diferente. “O que há de mais importante na sexualidade humana é o significado que você dá para ela”, afirma o psicólogo Maurício Amaral.

O sexo ainda é um tabu na sociedade atual, verdade seja dita, que ao sexo foram atribuídos inúmeros significados, principalmente por parte da religião, como pecado e reprodução. A ideia de castidade e pureza fizeram com que o sexo deixasse de ser algo natural, humano e então se torna algo pervertido e pecaminoso fora do casamento e do objetivo reprodutivo da espécie. A maior parte das pessoas vê o sexo como algo que concorda com o que aquela cultura diz naquele momento. O “certo” ou o “padrão” de comportamento sexual ganha determinadas características como: monogâmico, heterossexual, comprometido com o “amor”, a ideia de relacionamento ou compromisso religioso. O significado da sexualidade depende, então, do seu contexto cultural.

O psicólogo Maurício explica que existe uma separação entre o que é conhecido como sexo convencional e o sexo alternativo. “Se a gente pensar na população mundial sexualmente ativa, podemos grosseiramente dividi-la em duas partes: as pessoas que reproduzem a chamada sexualidade convencional, e as pessoas que escapam disso, o que é chamada de sexualidade alternativa”. Na comunidade fetichista, adepta de uma sexualidade alternativa, a pessoa que pratica apenas a sexualidade convencional é apelidada de baunilha. O termo então para a comunidade sexual alternativa é kink, e dentro desse universo estão todos os fetiches e atividades não-convencionais, como o swing, os ménage a trois.


Fetiche: substantivo masculino – objeto a que se atribui poder sobrenatural ou mágico e se presta culto.


A palavra fetiche, derivada de “feitiço”, é a definição de toda ação não-sexual que se insere no contexto sexual. Por exemplo, o fetiche por pés, conhecido como podolatria, é a atribuição de significado sexual a um objeto não-sexual: pés. “O fetiche é a atribuição de um poder erotizante a algo que não tem esse poder naturalmente”, esclarece Maurício.

O SIGNIFICADO (BDSM) é um termo guarda-chuva que inclui um universo de fetiches:

Bondage: a fetichização de restrições, tendo como prática mais comum a amarração utilizando cordas e algemas. 

 


Dominação/Submissão: conceito mais abstrato, envolve um jogo psicológico de poder entre os parceiros. Um objeto erótico que pode representar essa prática é a coleira.

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Ao imobilizar e vendar uma pessoa, você tem um poder em relação ao parceiro. (Foto: Reprodução documentário “Kink: o BDSM”)


Sadomasoquismo: Erotização da dor. Dentro da prática existem os Sadistas, que gostam de proporcionar dor e os masoquistas, que gostam se sentir a dor.

A praticante S.Z., de 18 anos, declara seu ponto de vista sobre as práticas: “Relacionar sexo a dor é uma coisa que faz eu me sentir mais viva do que se eu só fizer sexo”.

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Dominadora com um flog (Créditos: Daniele Fernandes)

Os fetiches se popularizaram através da internet, por meio de chats e blogs, que orientavam e servia como um lugar para contar sobre suas experiências. O próprio termo foi advento de comunidades de diferentes fetiches que passaram a se comunicar. R.B, praticante de sadomasoquismo, iniciou-se em uma era pré internet há mais de 27 anos. “Quando eu comecei não tinha internet e o acesso à informação era muito difícil, era no boca a boca e o pouco da literatura que tinha era em inglês. A gente tinha acabado de sair de uma ditadura, então as pessoas não falavam abertamente sobre isso. ”.

Já L.S. é uma submissa que teve o primeiro contato com o BDSM através do chat do UOL. Foi por esse canal que ela conheceu dominadores que a levaram a pesquisar sobre essas práticas e depois virar adepta. “Naquela época eram raríssimos os sites. A comunidade era mais restrita do que é hoje. Eu entrei em busca do prazer, por que prazer sempre foi o foco.” Hoje ela organiza pela internet um encontro mensal de submissas para discutir assuntos relacionados às práticas.

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Objetos para sessão de BDSM. (Créditos: Daniele Fernandes).

Hoje a comunidade é muito maior, existindo diversas plataformas e grupos no facebook. Alguns lugares específicos para os fetiches são o Fetlife e Sexlogpara adeptos do swing. Existe também o portal do Senhor Verdugo que é um dos primeiros sites dedicados ao BDSM no Brasil, sendo citado por todos os praticantes entrevistados. Com a internet as informações se tornaram mais acessíveis, dessa forma as pessoas começaram a se comunicar mais sobre sexo, fetiches e outros tabus.

O Sexo e a internet

O Tinder é o aplicativo de relacionamentos mais popular no mundo, com mais de 100 milhões de downloads. F., uma bauruense de 26 anos, diz que usa o aplicativo todo dia com o intuito de conhecer pessoas novas. Ela também comenta sobre o contato com o sexo no mundo virtual “Foi importante ter acesso a internet desde cedo porque eu usava para tirar dúvidas de coisas que não eram faladas em casa. E também compartilhar experiências e ver as inseguranças e curiosidades das outras pessoas, falar mais sobre sexualidade.”

N., também bauruense de 18 anos, usa o Tinder para abordar pessoas que já são de seu interesse e ver se a atração é recíproca. “Eu tinha zero informação e conversa sobre sexo em casa, aí eu ouvia algumas coisas na escola ou com os amigos que eu não sabia o que eram e eu usava a internet para pesquisar. Descobri a minha bissexualidade vendo pornô na internet, porque eu gostava de ver vídeos de lésbicas”.

“Na minha época de adolescente, estava em alta uma rede social que não se usa mais tanto hoje que é o Tumblr, por lá muita gente compartilhava experiência sexual, fotos e vídeos de pornografia e você ia descobrindo suas preferências mesmo sem ter contato com sexo. Era como se a gente estivesse se preparando, sabendo tudo sobre sexo sem ter experimentado ainda. Acredito que isso me ajudou muito a me posicionar e a saber bem mais cedo sobre isso, eu perdi a virgindade com 16 anos e me descobri sexualmente de maneira precoce”, comenta N.

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Créditos: Daniele Fernandes

Além de proporcionar um ambiente múltiplo de debate e informação a internet permite que a sexualidade e os fetiches sejam discutidos e encontrados por quem tem interesse. Se nas décadas anteriores a descoberta dos próprios e da sexualidade só acontecia depois de adulto, na era da internet isso muda pois são pessoas expostas ao sexo desde cedo. Apesar de terem contato com o assunto precocemente, o tabu de discutir isso em ambiente familiar pode ser um impedimento para expressar sua sexualidade. As duas bauruenses entrevistadas dizem que só passaram a exercer sua sexualidade e entrar em contato com objetos eróticos quando saíram desse ambiente familiar e compraram o seu primeiro vibrador.

Os desvios do mercado erótico

O primeiro Sex-Shop foi criado por uma mulher alemã, Beate Uhse. Ela começou como revendedora de produtos femininos, e passou a vender folhetos sobre o método contraceptivo chamado de Tabelinha e preservativos. Com o interesse das suas clientes passou a vender também outros produtos eróticos, transformando isso em um catálogo de vendas e depois em uma Sex Shop, em 1962.* Ou seja, os produtos foram criados por mulheres, para mulheres e com o tempo esse conceito foi se desvirtuando, voltando suas vendas para o público masculino.

No Brasil o mercado é considerado novo, com 30 anos, mas vem crescendo rápido. Na primeira realização da Erótika Fair, a maior feira do setor, em 1997, os negócios feitos somaram 300 mil reais. Em 2007 os negócios já somavam 700 milhões.  Para entender esse rápido crescimento é preciso entender também que o Brasil possui uma cultura muito conservadora. No país, até os anos noventa, as Sex Shops eram ambientes pouco receptivo para as mulheres.

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Créditos: Daniele Fernandes

Esse tipo estabelecimento veio dos Estados Unidos, com um modelo de lojas escuras, sem janelas, que oferecem além de produtos, cabines individuais de exibição de pornografia e sessões particulares de striptease. No Brasil até os anos 1990 as lojas apresentavam essa configuração, modificando para espaços mais amplos, claros e melhor localizados, assim o estigma começou a diminuir.*

O mercado brasileiro com o tempo se voltou para o público feminino, sendo hoje 70% dos consumidores. Os métodos se alteraram, trazendo ambientes confortáveis, discretos e sem a presença masculina. Uma trajetória retratada no filme “De pernas pro Ar” foi a da dona da marca Sexy Delícia, Érica Rambalde, que começou a vender os produtos em domicílio, os carregando em uma mala discreta e com o público feminino em mente. Para criar uma cultura receptiva, ela treinou vendedoras para explicarem de forma objetiva o funcionamento dos produtos.*

* Dados retirados do livro e tese de doutorado da escritora Luciana Walther, Mulheres que não ficam sem pilhas: Como o consumo erótico feminino está transformando vidas, relacionamentos e a sociedade.

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Créditos: Daniele Fernandes

A explicação objetiva das vendedoras é necessária pois as embalagens dos produtos geralmente dão explicações rasas e breves como “Gel para massagem íntima”. Essas instruções levam a uso errado dos produtos, não gerando o efeito desejado. Oferecer descrições explícitas e instrutivas é uma das táticas da sex shop online Loja do Prazer. Em suas newsletters, os produtos anunciados acompanham de explicações ilustradas do modo de uso, evitando o engano e tirando o tabu que existe sobre eles.

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Propaganda veiculada no site da Loja do Prazer para o dia das mães de 2018 (Foto: Reprodução)

A loja também aumenta o seu público alvo através da propaganda, ao assumir a existência de grupos que normalmente têm sua sexualidade negada, como é o caso da propaganda feita para o dia das mães.

Os tabus do erótico

O mercado brasileiro apresenta um grande apreço pelos produtos cosméticos, cremes, óleos, que são usados durante o sexo ou na fase das preliminares. Segundo Paula Aguiar, escritora e ex-presidente da Associação Brasileira do Mercado Erótico (Abeme), essa situação deve a fatores como preço, acesso, divulgação e o conservadorismo brasileiro, porque eles não substituem o papel masculino e é facilmente incluído em uma relação a dois, sempre pensando no prazer conjunto e não no individual feminino.

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Créditos: Daniele Fernandes

Até as vendas dos produtos está fortemente ligada ao fator cultural, de acordo com uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira do Mercado Erótico (ABEME), em 2014, no consumo feminino os mais vendidos são os cosméticos citados acima, enquanto para os homens os mais vendidos são produtos que estão diretamente ligados ao aumento do pênis.

Homens também possuem resistência em produtos que substituam a necessidade de um pênis, ou seja, a resistência a certos produtos, como dildos e vibradores, se deve ao próprio falocentrismo intrínseco na sociedade.

Com a internet, percebe-se o surgimento de inúmeras novas portas para a mulher. Sendo um lugar de complicação e discussão, mas também de luta, conquista e liberdade sexual feminina. Uma liberdade que talvez, um dia sonhou a alemã Beate Uhse.

Redação

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