Preconceito ainda é barreira; nem um terço dos clubes de futebol no Brasil possuem um “preparador da mente”
Gabriel Cortez
Quantos jogadores de futebol não perdem um pênalti por conta da pressão da torcida? E quantos tenistas não erram um saque por falta de confiança? Essas e outras dificuldades podem ser superadas através de técnicas motivacionais e de muita conversa ao pé do ouvido. Ao menos é o que defendem os estudiosos da Psicologia do Esporte, uma área científica em ascensão, que promete melhorar o desempenho dos atletas e levá-los ao topo do pódio.
A Psicologia do esporte surge para o mundo no início do século XX, em laboratórios de Fisiologia Aplicada, nos Estados Unidos e na União Soviética. No Brasil, os estudos na área começam na década de 1950, com o professor João Carvalhaes, que acompanhou o primeiro título da seleção brasileira na Copa do Mundo de Futebol de 1958, na Suécia.
O psicólogo do esporte atua com técnicas para o controle de ansiedade, agressividade e motivação, além de ajudar os atletas a superarem as situações de vergonha e medo e, consequentemente, seus adversários. “Essas intervenções do psicólogo do esporte recaem sobre questões cognitivas e de compreensão das emoções que estiverem fluindo no momento da prática esportiva”, explica o professor Afonso Machado, coordenador do Laboratório de Estudos em Psicologia do Esporte, da UNESP de Rio Claro.
O trabalho do psicólogo do esporte é feito no campo de jogo: “Na beira de uma piscina, na beira de uma pista de atletismo, num campo de futebol. É aí que o especialista na Psicologia do Esporte estará atento observando e fazendo as suas intervenções”, ressalta Machado.
Suzy Fleury é uma das mais conhecidas psicólogas do esporte no Brasil. Fiel escudeira do treinador Vanderley Luxemburgo, já trabalhou em clubes como Palmeiras, São Paulo e Corinthians e auxiliou jogadores de Seleção Brasileira, como Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e Roberto Carlos. Para Fleury, o desenvolvimento emocional não acompanha a evolução física dos atletas, e aí está a importância do trabalho do psicólogo do esporte.
“Com a evolução da medicina esportiva, o atleta passou a ser um super-homem fisiologicamente falando. Mas, muitas vezes, com comportamento infantil ou até rebelde, típicos da adolescência. A evolução da maturidade psicológica não está acompanhando o aspecto físico. E aí a gente vê verdadeiras infantilidades. Um atleta que é de um clube grande, em uma competição importante, faz um gol e tira a camisa sabendo que vai tomar cartão amarelo, isso é infantilidade. Ou pior, termina o jogo e ele vai provocar e toma o cartão vermelho. Isso não é digno de um atleta profissional”, afirma Suzy.
Hoje, o futebol continua sendo a modalidade que mais utiliza a psicologia do esporte para melhorar o desempenho dos atletas. Para Afonso Machado, a alta rentabilidade desse esporte é o que explica o fenômeno.“Veja só que coisa interessante. Nós temos o esporte inserido na sociedade do espetáculo. E ele, estando inserido na sociedade do espetáculo, também se situa enquanto um momento do espetáculo. Sendo um momento do espetáculo, ele custa. Custando, ele é muito rentável. Sendo rentável, acaba fazendo uso das melhores ferramentas. O psicólogo do esporte é uma delas”, frisa Afonso Machado.
No entanto, somente 30% dos clubes do futebol brasileiro possuem um profissional que trabalhe com a mente dos atletas. Prova disso é que, entre as quatro maiores agremiações paulistas, apenas o Santos possui um psicólogo em sua comissão técnica. Machado explica que existe um certo preconceito com o termo Psicologia e ressalta que a palavra ainda é, erroneamente, associada à loucura.
“Algumas equipes não fazem uso da Psicologia do Esporte por entenderem que isso é desnecessário. Por entenderem que psicologia do esporte trata de deficiências psicológicas, de doenças mentais. E a psicologia do esporte não trabalha com isso. Trabalha com esportes. O que acontece, na verdade, é um preconceito muito grande com a Psicologia do Esporte. Se o nome fosse Assessoria Motivacional, talvez caísse bem”, afirma Afonso Machado.
Para ele, “a psicologia do esporte pode atuar como um diferencial para os atletas, numa época em que a parte física e a parte técnica se encontram, cada vez mais, em pé de igualdade”. Basta que se supere o preconceito.