Luís Negrelli e Leonardo Guerino
Entre as rugas e os anos de experiência, uma pequena brecha para descobrir verdades tão singelas e incertas. De outro lado, a jovialidade e os traços ainda de pura ingenuidade. Aquela tarde de sábado nos levou para longe. Quase um século atrás. Com a devida licença poética, viajamos até aquelas tardes fagueiras, à sombra das bananeiras, debaixo dos parreirais! Sim, dos parreirais.
Aquela tarde foi a mais suave dos últimos tempos. Logo no portão, a permissão para entrar e conhecer um outro mundo. O local pede para fruir a imaginação. Entro na Pousada da Colina. O espaço é terreno da calmaria. De uma calmaria por vezes exagerada. Em qualquer canto se ouve um canto, ou de um pássaro ou de uma pessoa. Melodias carregadas de anos. Era um encontro sem agendamentos prévios no asilo de idosos na área mais alta da cidade de São Manuel, no interior de São Paulo.
De longe, já é possível observar a rotina do local. O clima é ameno naquela metade de tarde. Hora do café. Um cheiro suave de produtos de limpeza toma conta. É preciso esperar esse momento mais que sagrado. “Pode aguardar um pouco, logo logo ela já vai pro quarto”, disse uma funcionária. Vou para um jardim de um verde ofuscante, radiante. Qual a primeira coisa que a gente faz? Pega o celular e tira uma foto. E entre registros, cumprimentos e saudações de “boa tarde”, o tempo passou ligeiro. O refeitório já está vazio novamente. Chega a hora. 
Aquele corredor
O chão está tão lustroso que ao caminhar é possível ouvir o ranger dos sapatos, como se estivesse caminhando num piso encerado. Os passos se dão num corredor com janelas grandes que permitiam a entrada de bastante sol. Uma cadeira e um armário de ferro fazem parte do cenário. Alguns passos mais e já é possível notar a plaquinha colada na parede ao lado da porta. Uma foto sorridente com alguns escritos: “Carmela Maria Nalli Guidone. Data de Nascimento: 15/09/1917”.

Logo na entrada do quarto, um pouco da vida de dona Carmela começa a ser revelada. (Foto: Luis Negrelli)