O “sim” dito perante o líder religioso ou para o juíz marca uma cerimônia existente nestes moldes desde que o cristianismo foi proclamado a religião oficial no Império Romano. O tão tradicional casamento é aguardado ansiosamente tanto pelos noivos, como pelos familiares. Não é à toa que, a cada aniversário, canta-se o famoso “com quem será?” e aqueles que não abraçam o matrimônio e aceitam “ficar para titio(a)” são vistos com maus olhos como tudo o que foge da normalidade definida pela sociedade.
Por mais que a prática continue a mesma, com juras no altar, vestido branco da noiva, festa e lua de mel, houve algumas mudanças. Mas, será mesmo o casamento uma ‘instituição falida’, como estão dizendo por ai? “Nas últimas décadas, tem ocorrido uma reconfiguração de costumes e crenças. Existe uma tendência a acompanhar o que é novo nas sociedades urbanas, mas a manter as tradições ainda vivas”, explica o psicanalista Carlos Kessler, professor do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS e diretor da clínica de Atendimento Psicológico da universidade. A novidade está em quem está casando, a idade com que as pessoas se casam e quanto tempo dura esse casamento. Segundo estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) sobre o registro civil, em 2014, houve um aumento de 5,1% no número de casamentos, o que totaliza 1,1 milhão de cerimônias. Dentre eles, 4.859 (0,4% do total) foram entre pessoas do mesmo sexo. As pessoas estão se casando mais tarde. Na média histórica, de 1974 a 2014, enquanto os homens casavam com 27 anos, hoje o fazem com 30. Já as mulheres casam-se com, em média 27 anos, 4 anos a mais do que a média histórica, de 23.
O analista técnico do IBGE, Ennio Melo, explica que essa tendência é decorrente de diversas mudanças que vem ocorrendo nos padrões de composição dos arranjos conjugais e familiares, tais como as facilidades legais e administrativas para a obtenção de divórcio.
Segundo o advogado especialista em Direito de Família Olavo Pelegrina Junior, esses números mostram o comportamento dos brasileiros em relação aos casamentos, união estáveis e divórcios. “As pessoas estão amadurecendo, buscando uma colocação financeira, estabilidade, para só depois irem para os casamentos”, explica Olavo Pelegrina.
Com Carlos Rodrigues, de 46 anos e Andreia de Paula, de 44, aconteceu desta maneira. Eles se conheceram ainda jovens, namoraram, tiveram 4 filhos, mas foi em 2014 que oficializaram a união. “ Nossos filhos começaram a perguntar por que não tínhamos nos casado, como os pais de muitos colegas deles. Além disso, uma questão burocrática, relacionada ao seguro saúde, nos fez começar a pensar mais sore o assunto. Então, como já havíamos “testado” o suficiente nossa relação, decidimos nos casar”, conta Andreia. Segundo a advogada Delma Silveira Ibias, presidente da Comissão da Mulher Advogada OAB/RS, muitos casais vivem juntos, mas não formalizam até que compreendam que a relação sobreviverá as intempéries do dia a dia, como a convivência, as mudanças de trabalho e de rotina.
Para Mariano Neto, bailarino e Gustavo Augusti, médico, as justificativas são distintas, mas o casamento foi tardio da mesma maneira. Ambos dedicaram-se as suas respectivas carreiras para só depois, estabilizados, se casarem. “Até os 25 anos, pelo menos, eu estava mais focado na minha carreira, na formação profissional e na minha independência financeira. Somente depois que conquistei isso é que passei a sair mais, conhecer pessoas novas”, relara Gustavo.
Segundo o psicanalista Kessler, esse é um dos motivos que têm levado os brasileiros a casar cada vez mais tarde. O professor argumenta que os indivíduos estão mais preocupados com a realização profissional e com seus próprios interesses do que com a dedicação ao parceiro. Um reflexo disso é que as pessoas tendem a ficar mais sozinhas e assim, os casais vão se formando após os 30 anos.
Bem como o casamento, o divórcio também cresceu. Segundo o advogado Olavo Pelegrina, entre 1984 e 2004, o número de divórcios passou de 30 mil para 341 mil, o que revela o tempo de duração dos casamentos e que eles estão acabando com mais frequência. Mulheres na faixa dos 40 anos e homens com 44 anos são as que mais se divorciam. Diante de uma melhor compreensão dos seus direitos, as mulheres, principalmente, pouco têm aceito violências e traições. A Lei do Divórcio, de 26 de dezembro de 1977 proporcionou liberdade aos que tendo formalizado a escolha do parceiro, não queriam mais continuar naquela relação.
Um estudo não oficial do escritório Nannini e Quintero Advogados Associados verificou que no primeiro semestre de 2015 houve um aumento de 75% nos casos de divórcio em relação ao mesmo período do ano de 2014 devido a crise econômica. A falta de renda gera constantes desentendimentos que, aliado a outros fatores, fazem com que o casal se separe.
Segundo André Nannini, os clientes que se divorciam são de classe A ou B, tem dois filhos e faixa etária de 36 a 45 anos. O custo de uma separação, incluindo honorários advocatícios, custos processuais e impostos é de cerca de 12% do patrimônio para os divórcios consensuais e nos litigiosos pode dobrar em decorrência da contração de advogados por cada uma das partes. Os divórcios consensuais, quando não há filhos menores, pode ser feito via cartório e se resolve em até 30 dias, nos judiciais consensuais, o prazo médio é de 6 meses e nos litigiosos é indefinido, mas superior a 4 anos.
Mas, se a crise econômica afeta o casamento, o mercado de cerimônias está faturando 15 bilhões por ano e movimentando 8,500 empresas em todo o Brasil. Até mesmo aqueles que já são divorciados rendem-se a novos casamentos e novas festas, até porque os casamentos estão durando, em média 15 anos ao invés de 19. Os recasamentos aumentaram de 13,7%, em 2004, para 23,6%, em 2014. Quando somados às uniões estáveis, essa porcentagem passa de 50%.
Diante deste cenário, percebemos que os aspectos culturais, sociais, políticos e econômicos afetam diretamente o casamento como instituição e como diz a famosa frase: “enquanto as novelas terminarem em casamento, os casamentos continuarão acontecendo.”