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O debate racial na série Cara Gente Branca

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Entrevista com Gessica Borges, mestranda em Estudos Africanos, amplifica a importância da série, que acabou de estrear sua segunda temporada

Lançada em 2017, a série original da Netflix Cara Gente Branca começou causando polêmica. O teaser que anuncia a série (abaixo) mostra uma menina negra falando para pessoas brancas: “cara gente branca, aqui está uma lista de fantasias de Halloween aceitáveis: piratas, uma enfermeira abusada, qualquer um dos nossos 43 primeiros presidentes. Primeiro da lista em fantasias inaceitáveis: eu”.
A crítica é em referência ao blackface, uma prática teatral que remonta ao século 19, em que atores brancos pintavam o rosto com carvão para parecer e ridicularizar pessoas negras. Na época, os negros eram extremamente excluídos da sociedade, não tinham direito a voto e eram vistos como inferiores. Ainda assim, até hoje acontece de pessoas brancas pintarem o rosto para satirizar os negros.

Logo quando a Netflix anunciou a série, enfrentou diversas críticas — e até boicotes — de assinantes mais conservadores. O teaser de Cara Gente Branca tem 58 mil curtidas no YouTube e um número assustador de 429 mil descurtidas. Mas será que a série realmente tem graves problemas ou essa reação exacerbada é mais um reflexo do racismo na sociedade? (Spoiler: a segunda opção.)

Sobre o que é Cara Gente Branca

“Ambientada em uma universidade de elite e predominantemente branca onde as tensões raciais se escondem por trás das aparências, Cara Gente Branca é uma paródia hilária de uma América pós-racial e retrata a história universal da busca por identidade”, segundo a Netflix.
Ela é baseada em um filme com o mesmo nome lançado em 2014 e teve um dos episódios dirigidos por Barry Jenkins, que também dirigiu Moonlight, título que ganhou o Oscar para melhor filme em 2017.
A série se passa em uma universidade norte-americana chamada Winchester University, onde a maioria dos estudantes é branca. O primeiro episódio começa criticando uma festa organizada por homens brancos da revista Pastiche em protesto ao programa Cara Gente Branca da estudante negra Sam White. Depois, cada episódio da série (são dez na primeira temporada) focam em cada personagem da trama.

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Samantha White, interpretada pela atriz Tessa Thompson. Fonte: Netflix.


A segunda temporada estreou em 4 de maio de 2018 e aprofunda o debate racial proposto pela série. A protagonista, após um protesto no final da temporada anterior, precisa lidar com a retaliação de um grupo de direita em sua vida. Além disso, Cara Gente Branca continua com a mesma dinâmica, de colocar em destaque cada participante do elenco principal por episódio.
“De forma inusitada e bem-humorada, Cara Gente Branca faz uso de ironia, autodepreciação e uma honestidade brutal para abordar assuntos que afetam a sociedade moderna”, finaliza a sinopse da Netflix sobre o título.

Como é o debate racial em Cara Gente Branca

Para entender o debate racial proposto por Cara Gente Branca, optamos por dar voz à Gessica Borges, mestranda em Estudos Africanos na Universidade do Porto, estudiosa e fã da série.
Borges já assistiu às duas primeiras temporadas e opina que “o mais interessante [em Cara Gente Branca] é a forma como a série aprofunda a personalidade de cada um dos personagens através de suas experiências pessoais e como isso contribui para as questões raciais que se desenrolam no enredo”. Veja a íntegra:
Jean Prado: Quais as críticas que ela faz sobre a sociedade de hoje?
Gessica Borges: Na primeira temporada eles já tratavam da questão da complexidade de ser uma pessoa negra na sociedade dedicando cada episódio a um personagem específico (com a questão da universidade de fundo, claro), mas na segunda temporada esta abordagem é elevada a outro nível pois eles continuam a aprofundar cada personagem, mas sem o tom mais “didático” próprio da primeira temporada (didático para pessoas brancas, claro).
A segunda temporada tem um troll que faz ataques racistas pela internet com a protagonista, Sam, e o fato de como isso afeta a ela e, por consequência, aos outros ao redor é muito bem trabalhado. No sentido de realmente descavar as características mais “sutilmente” nocivas do racismo. Além disso, a trama envolve uma suposta sociedade secreta que remete a referências históricas importantes para o trajeto de afro-americanos e o quinto episódio é especialmente significativo para entender como nós, pessoas negras, podemos ser tão heterogêneas, mesmo quando lutamos pela mesma causa.

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Fonte: Netflix.


JP: Quais as críticas que ela faz sobre a sociedade de hoje?
GB: Há críticas de cunho racial, principalmente, mas também de classe, política, estética, cultural. Em linhas gerais, eu poderia dizer que a crítica mais importante imposta pela série é a importância de nos abrirmos a novas ideias, grupos e culturas e, no caso da luta antirracista, especialmente, procurarmos entender o background histórico por trás do racismo institucionalizado que afeta a sociedade norte americana, mas brasileira também.
É sobre evitar o pensamento maniqueísta e entender que as tensões raciais, sociais, sexuais e outros problemas da sociedade são complexos e plurais.
JP: As críticas são pertinentes?
GB: Evidente. Se pensarmos na sociedade brasileira contemporânea, por exemplo, é óbvio que estamos vivendo uma guerra ideológica majoritariamente dualista, que exclui nuances e dificulta o diálogo entre opostos.
É assim na política, na “luta de classes”, na “guerra dos sexos” e nas questões raciais, idem. O nome da série ironiza o fato de que pessoas negras tem que, em geral, educar pessoas brancas sobre racismo, mas no fundo é uma chamada para um diálogo necessário para a nossa sociedade atual.
JP: Quais os erros e acertos da série?
GB: Falando da primeira e segunda temporada em geral, acho que os erros ainda estão em personagens que soam muito roteirizados, estereotipados e “tontos” (como um mestiço chamado Al e uma mulher “extravagante” chamada Kelsey), mas ao mesmo tempo, no caso da Kelsey, são aprofundados na segunda temporada a fim de que possamos entender suas personalidades.
Outra coisa que eu acho que poderia ser melhor trabalhado são os personagens negros de pele escura. Sam tem a pele clara e é a protagonista e acaba que muitas coisas giram em torno dela e seus próprios conflitos, como estar em um relacionamento inter-racial, por exemplo. Mas me parece que personagens de pele escura como a Coco ou a Joelle poderiam trazer problemas melhor relacionados com a comunidade negra ou pelo menos mais “presentes” na vida de pessoas negras, justamente por não teremos como esconder, de forma nenhuma, a sua negritude.
Mas, de forma geral, acho que a série acerta muito em fazer um esforço para multiplicar as personalidades negras, suas incoerências, lutas internas e externas. E o faz com brancos também, através do Gabe (namorado da Sam na primeira temporada).

Redação

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