Eles mataram Pac, mataram Big / Eles querem matar um mano que resiste / E nós queremos ser livres!
Por Elder John e Victor Toledo
Nesta última segunda-feira (7), o rapper BK’ lançou seu terceiro (e tão esperado) álbum: O Líder em Movimento. Agora, com 30 anos, o artista lançou o disco com 10 faixas e foi a primeira vez que assinou como Abebe Bikila (seu verdadeiro nome) e não mais como BK’. Tiveram as participações da Polly Marinho em uma intro, do Erasmo Carlos em um refrão e da Ainá Garcia em uma ponte, fazendo com o que o trabalho fosse o mais pessoal possível. Além, é claro, dos beats do Jonas Profeta presentes em 8 músicas, como já era esperado, e Nansy Silvz e a dupla Deekapz, com uma faixa cada.
Após toda a expectativa criada pelo público desde o anúncio do lançamento, o álbum está na pista e, como de costume, é de alto nível. A gente lembra que o primeiro disco do rapper foi Castelos e Ruínas (2016), depois vieram os EP’s Antes dos gigantes chegarem Vol. 1 & 2 (2017) e o último grande projeto que foi Gigantes (2018).
Muito se falou sobre a mudança de estilo do artista nessa transição entre o primeiro e o segundo álbum. Já que C&R foi um trabalho mais melancólico, excêntrico e até surpreendente pela complexidade apresentada por um artista jovem na cena, e Gigantes, um disco mais leve, musical e talvez experimental do rapper, variando diversos estilos de levada e fugindo da zona de conforto criada pelo primeiro projeto.
O Líder em Movimento veio como uma mistura dos dois primeiros, mas na pegada mais sequencial, cada faixa complementando a anterior. E o mais importante, músicas com a temática racial que se apresentam em um contexto muito pertinente, tendo em vista as diversas manifestações que estão acontecendo no mundo e principalmente, nos EUA. A busca pela valorização das vidas negras acontece aqui no Brasil também e um artista desse porte não poderia agir diferente, com um disco servindo de livro para a periferia, já que ainda existe tanta injustiça, desigualdade e racismo.
BK’ fala sobre diversos líderes do movimento negro, Abdias do Nascimento, Marielle Franco, Martin Luther King, Malcom X, e até mesmo dos rappers Tupac Shakur e Notorious BIG, como no verso: “Eles mataram Pac, mataram Big / Eles querem matar um mano que resiste / E nós queremos ser livres!”, ressaltando o principal objetivo do povo negro que é simplesmente ter a liberdade que nos foi tirada.
Em cima disso, quando Abebe afirma que o rap dele não é consciente, mas na verdade, é consequente, conseguimos compreender ainda mais a necessidade da sociedade em ouvir e refletir sobre as questões raciais e de violência no nosso país. E ainda assim, o artista declarou que a produção do disco foi antes de todas as manifestações que aconteceram ultimamente, mas que casou perfeitamente com o cenário atual.
Além do mais, o álbum todo é refletido nesse enredo, com destaque para o verso: “Melhor que um líder sábio, é só um povo sábio”. O povo negro sabe a importância dos líderes, pela questão da identificação e também na busca por voz ativa na sociedade, sendo assim, se cada um for um líder, o povo todo estará empenhado em busca do mesmo objetivo.
O jornalista João Rafael Venâncio comentou sobre o álbum e a importância para os jovens negros: “É o trabalho mais maduro do BK’, chegou numa questão estética e lírica muito boa, um pouco parecido com C&R, mas com formação e conceito mais bem definidos. E a gente precisa de ideias assim, acho muito importante essa temática (questões raciais e de identificação abordadas no álbum). O Djonga também falou sobre isso, como fazer o dinheiro ficar entre a própria população e enriquecer nesse giro. Trazer essa conversa em um disco, para um público mais jovem que nunca parou pra pensar nisso é muito legal”, afirmou.
Outras passagens nas letras passam essa visão muito interessante, como no trecho da faixa Porcentos 2: “Hey, gueto não devia vender droga pra gueto / Burguesia perde a linha e nós dominando, tá perto”. Juntamente com a questão da venda e do consumo de drogas nas periferias, BK’ traz uma perspectiva de futuro para quem está nessa situação. Não, não devíamos vender drogas pro irmão que também está no gueto. E sim, devemos dominar os lugares que eram da burguesia.
E como já foi dito pelo próprio Abebe na faixa Do Nectar Freestyle, lançada antes do álbum: “Me ponha no top 5 de todos os tempos que é pra ser mais preciso / Falam que eu exagero, espera sair meu disco / Eu exagero mas não minto”. E, de fato, não mentiu. Principalmente pro jovem negro, a importância desse disco é incalculável por diversos aspectos, além da figura do próprio BK’, mais relevante a cada dia, ele se tornou o líder em movimento pelo gueto e pelos pretos.