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Psicofobia e os desafios enfrentados pelas pessoas com transtornos mentais

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Conheça as barreiras que o preconceito constrói para os pacientes diagnosticados com depressão, ansiedade e outros transtornos mentais

Larissa Caliari e Lívia Reginato (larissabc4@hotmail.com e livia.redavi@outlook.com.br)

Marisa Souza*, hoje com 20 anos, conta que a primeira vez que enfrentou o estigma e o preconceito acometido sobre as pessoas que possuem transtornos mentais aconteceu quando era ainda uma pré-adolescente em sua própria família. “Meu pai me chamou de fraca e muitas outras coisas após descobrir que eu tentei suicídio quando tinha 11 anos, época em que morava com ele”. Infelizmente esse tipo de situação faz parte do cotidiano de pessoas como Marisa.

Setembro é o mês oficial no Brasil de prevenção ao suicídio. A campanha brasileira, com o nome de Setembro Amarelo, foi criada no ano de 2015 por uma parceria entre o Centro de Valorização da Vida (CVV), o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e dura o mês todo. Seu objetivo é divulgar o tema e conscientizar a população da importância do debate sobre o tema por meio de ações, campanhas e palestras.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 90% dos caso de suicídios estão associados a transtornos mentais, sendo o transtorno depressivo o que acomete 36% das vítimas. A OMS também aponta que o Brasil é o país com a maior taxa de pessoas que possuem transtorno de ansiedade no mundo e o quinto em casos de depressão. Estima que 9,3% dos brasileiros têm algum transtorno de ansiedade e 5,8% possuem algum tipo de transtorno depressivo.

Quem são os neuroatípicos?

Atualmente, vemos o termo neuroatípicos sendo utilizados, tanto  profissionais da área da psiquiatria e da psicologia, quanto nas mídias sociais. Esse termo costuma ser utilizado de diferentes formas, para se referir a pessoas com as mais diversas características. Alguns exemplos do uso desse termo são para se referir a pessoas com depressão, transtornos de personalidade, transtornos de ansiedade, e também para se referir aos autistas. Apesar disso, ainda não existe um consenso sobre a forma mais adequada para se empregar o termo.

O termo “neuroatípicos” foi criado no ano de 1990, pela socióloga australiana Judy Singer, com o objetivo de representar as pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), mais conhecido como autismo. A socióloga, que também era autista, acreditava que o autismo não pode ser considerado uma doença, já que não é algo que precisa de cura. Para ela, se trata apenas de mais das muitas formas de diversidade humana, como a cor da pele, a sexualidade, o gênero, a nacionalidade etc. Nesse caso, a diferença presente nos autistas, é o funcionamento do cérebro e, consequentemente, a forma de pensar e enxergar o mundo.

Desde então, até os dias de hoje, muitas pessoas lutam para que o TEA passe a ser tratado não mais como uma patologia, mas sim como um jeito diferente de ver o mundo. Apesar disso, existem relatos de pais de crianças com um grau alto de autismo, que acreditam que se trata sim de uma doença, e que merece cuidados e tratamento. É a partir dessa falta de consenso que surgem as controvérsias. A psicóloga Priscila Guidugli, doutoranda em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), conta que do ponto de vista médico a depressão, a ansiedade e os transtornos de personalidade também são tidos como neurodiversidade.

Priscila defende que existem diferenças significativas entre esses diagnósticos e o autismo, a principal delas é a duração dos quadros, que no caso do autismo o paciente possui alterações cerebrais permanentes. “No caso de depressão, transtornos de ansiedade e alguns de personalidade, as alterações cerebrais não são condições estruturais e permanentes, mas sim alterações relativas a hormônios, como a receptação de serotonina. Então acredito que o termo não deva ser utilizado, ainda que haja casos de transtorno de personalidade com alterações cerebrais”.

Problemas psicológicos são doenças?

Apesar das críticas e controvérsias o autismo ainda é sim considerado uma doença, e inclusive, desde 2013, existe um Código Internacional de Doenças (CID) próprio a ser utilizado nos casos de TEA. Antes disso, o autismo se enquadrava no mesmo CID utilizado para outros vários transtornos. Já quando tratamos da depressão, da ansiedade, e dos transtornos de personalidade, existe um consenso entre os profissionais da área, que afirmam que todos esses quadros se tratam de doenças psicológicas e são vistas do ponto de vista médico como outra patologia qualquer.

A psicóloga Marcele Vieira acredita que nos dois casos, no autismo e nos transtornos psicológicos, esses diagnósticos devem ser encarados como doenças, para que esses pacientes possam receber os devidos cuidados. “Para que se existam direitos no âmbito da saúde pública, precisa de ser considerado uma doença, pois o que não está doente, não se trata. Os transtornos citados, possuem grande importância na vida de seus portadores e seus sintomas podem se tornar graves, ameaçando a vida dele”, pontua.

Para o médico psiquiatra Fabricio Bértoli Gimenes, especializado no tratamento de dependência química pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), “temos que tomar cuidado para não estigmatizar os transtornos mentais. O termo mais usual no momento seria a palavra ‘transtorno’, como transtorno de personalidade, transtorno de espectro autista e assim por diante”. Mas, aconselha que “a melhor maneira de se referir ao paciente seria aquela que cause o menor estigma possível, a fim de ajudar a quem precisa e não rotular ou estigmatizar quem sofre com algum problema de ordem emocional ou transtorno mental”, ou seja, na prática o profissional da saúde deve ponderar qual vai ser a melhor forma de abordar o paciente.

De qualquer forma, mais importante do que descobrir qual a melhor forma de se utilizar os termos, é entender que a psicofobia existe. Atingindo tanto aqueles que possuem autismo, quanto aqueles que possuem depressão, ansiedade e outros transtornos. Parte disso, pode estar relacionado à questão da saúde pública no país, de acordo com Priscila.

“A saúde mental é negligenciada no Brasil, seja pela falta de informação ou de recursos. Existe uma crença de que depressão e ansiedade é frescura ou falta do que fazer e que transtornos de personalidade são coisas de pessoas sistemáticas e muito chatas” 

É possível perceber então, que muitas vezes a pessoa que sofre com algum problema psicológico acaba tendo seu quadro deslegitimado por outras pessoas, que acreditam que essas patologias não são doenças tão reais quanto uma doença física, por exemplo. “A presença desses sintomas podem diminuir a qualidade de vida dos pacientes, e muitas vezes o último a perceber é o próprio afetado. Por isso, a importância da família, amigos, cônjuge, enfim, pessoas que convivam com o paciente onde podem perceber a necessidade de ajuda antes mesmo que o próprio paciente”, ressalta Fabrício.

infográfico sintomas

(Fonte: Unidade Intermediária de Crise e Apoio à Vida (UNIICA). Elaboração: Larissa Caliari)

Em termos médicos, os sintomas podem ser não só psicológicos, mas algumas também físicos. Marcele explica que as manifestações psicossociais são visíveis. “Existem diferenças notáveis entre o paciente saudável mentalmente e o que se encontra adoecido, tais como mudanças de comportamento e humor”. Mas além disso, Fabrício ressalta que “podem existir outros tipos de sintomas, como os sintomas psicossomáticos por exemplo, que são manifestações físicas que o emocional não está bem, como mãos formigando, angústia, taquicardia, entre outros”.

As várias faces do preconceito

“Os diversos preconceitos se caracterizam por diferenças, exclusões, vergonhas, ofensas, discriminações, intolerâncias que acontecem por vezes na família, amigos, conhecidos, nas ruas, nas relações de trabalho, nas empresas, enfim na sociedade como um todo” – sintetiza Ednéa Morilla, formada e licenciada em Psicologia pela Universidade Estadual Paulista (UNESP).

É comum que digam para depressivos, por exemplo, que eles “tem tudo” e por isso não devem ficar tristes, ou mesmo que há “pessoas em situações piores que a sua”, completa o psiquiatra. Fabrício ainda explica que esse tipo de fala faz com que “a pessoa se sinta ainda mais inferiorizada como se tivesse feito uma escolha de não ficar bem, isso acaba prejudicando ao em vez de ajudar”.

O médico faz uma comparação para explicar a situação. É o mesmo caso de se dizer que uma pessoa com pressão alta é fraca ou que isso é somente coisa da cabeça dela, por exemplo.

“A pressão alta não aparece nos elementos de sangue ou tomografia, mas quando identificada deve ser tratada o mais rapidamente possível. Com a depressão e ansiedade é a mesma coisa. A pessoa não escolheu ficar mal, ela precisa de tratamento o quanto antes” – orienta o psiquiatra Fabrício Bertolli.

Ainda, para melhor compreender os transtornos da mente é preciso que a sociedade entenda que elas são diferentes dos sentimentos do dia-a-dia. “A tristeza e a ansiedade são sentimentos inerentes ao ser humano e nem toda tristeza é uma depressão” – explica Fabrício. Edinéa acrescenta que o grau de permanência desse estado – de tristeza ou de ansiedade – é o que vai definir se um sentimento é na verdade um sintoma que interfere na vida diária da pessoa.

Além da vida pessoal

As dificuldades enfrentadas por pessoas com transtornos mentais também se refletem nos ambientes de estudo e trabalho. “Certa vez eu estava participando de alguns processos seletivos para estágio e várias pessoas próximas me orientaram a não mencionar meus problemas psicológicos para não ser descartada da vaga” – conta Amanda Castro*, 22 anos. Vitória Soares*, 26 anos, já empregada, diz também não se sentir segura no ambiente corporativo: “não há respeito em relação a esse tipo de transtorno. Ele é visto como fraqueza e o retorno negativo dos colegas só piora a situação”.

Galeria de depoimentos coletados em nosso levantamento, os nomes foram trocados para preservar a identidade dos entrevistados. (Arte: Lívia Reginato)

No ambiente escolar e acadêmico, o quadro também se repete. “Certa vez uma professora disse que só abonaria minhas faltas por doença como se depressão não fosse isso” – relata Júlia Santos (24). Já Rogério Machado (53), conta que por falta de conhecimento sobre o seu transtorno de aprendizado, foram anos de sofrimento. “Fui classificado por professores, colegas e parentes como preguiçoso, desatento e incapaz” – desabafa.

Carla Mota*, de 23 anos, conta que seu quadro clínico só foi levado a sério quando sua situação física e psíquica se agravaram. “Meus pais me ajudaram e me apoiaram e hoje em dia abriram a cabeça em relação a isso, mas é triste eu ter chego no pior estágio da doença para eles terem percebido que o que eu tinha não era drama, não era frescura, preguiça, nem falta do que fazer” – desabafa.

Relatos como o de Carla foram extremamente comuns em nosso levantamento que obteve 32 respostas. Júlia Santos* (24), lembra de quando tentou pedir ajuda à sua mãe quando tinha 16 anos, mostrando suas cicatrizes de auto-mutilação. “Ela soltou uma risada sobre a minha condição e disse sarcasticamente que eu deveria fazer teste de atriz da globo de alguma novela de drama”. Depois de sua revelação ela relata serem frequentes os comentários colocando sua condição como “frescura” e “se fazer de vítima”.

Fabrício esclarece que os transtornos mentais são classificados como doença, estando inclusive no Código Internacional de Doenças (CID). Edinéa adiciona que as mazelas da mente deve ser consideradas enfermidades como qualquer outro tipo de patologia e não deve ser ignoradas, podendo se agravar à medida que o paciente permanece sem o devido tratamento.

“A saúde mental, a saúde física e a saúde espiritual são fios da vida estreitamente entrelaçados, porém independentes e cuidar da saúde mental é de extrema importância” – aconselha Edinéa. 

Priscila também conta que esse preconceito acaba interferindo na hora que o paciente decide que precisa de ajuda. “Muitas pessoas deixam de procurar atendimento médico e psicológico por acharem que é coisa de louco, acreditam que todos os medicamentos causam dependência etc”. Além disso, existe a resistência dos pacientes na hora de procurar ajuda e realizar o tratamento, porque muitas vezes surge a vergonha de admitir um problema que é invisibilizado pelo restante da população. Marcele conta que o processo se torna mais complicado quando os pacientes sofrem esse preconceito. “Isso dificulta em todos os sentidos a melhora e recuperação destes pacientes, que se sentem ameaçados, humilhados e indefesos”.

Assim, muitas vezes a pessoa que se encontra com problemas psicológicos se sente sozinha e desamparada e outras tantas acaba não tendo forças para procurar ajuda e se tratar através de iniciativa própria. É aí que surge a importância da família para a melhora do paciente. Marcele ressalta que “quando paciente se sente acolhido e respeitado em sua dor a chance de melhora e recuperação são maiores”. “Em muitos casos a pessoa precisa desse suporte para se locomover para realizar os tratamentos (no caso de crianças, por exemplo)” – complementa Priscila.

Dificuldades da busca por ajuda 

Fabrício ressalta que as alterações no corpo do paciente acontecem quando eles apresentam qualquer tipo de problema psicológico, e por isso é imprescindível que o tratamento seja realizado. “Depressão e ansiedade são considerados transtornos do humor, podendo se manifestar através de desajustes neuro-bioquímicos, como a serotonina, por exemplo. Já no caso dos transtornos de personalidade, a situação muda, pois “nesse caso, a personalidade propriamente dita se encontra alterada, não necessariamente encontramos um desajuste neuro-bioquímico” – explica o psiquiatra.

Terapia para quem_

Fabrício orienta a busca de ajuda profissional em caso de alguma suspeita, pois “quando a depressão for caracterizada, deve ser tratada e por isso é muito importante a avaliação de um profissional especialista”. Contudo, infelizmente, os estigmas sociais em torno dos transtornos mentais dificultam a busca por ajuda. A aceitação da doença é difícil, tanto pelo próprio paciente, quanto pelas pessoas ao seu redor como sua família e amigos.

Há também uma resistência quanto a medicação. Sônia Alves*, 24 anos, conta que demorou a procurar o tratamento pois tinha preconceito com o uso de medicação. “Mesmo tento os sintomas há muito tempo resistia em procurar ajuda por estigmatizar o uso de medicamentos psiquiátricos”. Os medicamentos são muitas vezes comparados com drogas entorpecentes. Apesar disso, o médico confirma que “o arsenal medicamentoso é vasto e muito seguro, são medicamentos comuns que devem ser manuseados por um profissional da área, no caso, o psiquiatra”.

Laura Morais*, 18 anos, faz uso de medicação e buscou ser transparente com as pessoas próximas à ela, mas percebeu que não é todo mundo que entende. “Muitas pessoas já se afastaram de mim ao perceber a quantidade de remédios que tomo”. Ela também relata já ter sido aconselhada por seus familiares a “sair dessa”, como se seu tratamento fosse algo ruim ou desnecessário.

Edinéa explica que “o profissional de psicologia é habilitado a realizar a psicoterapia, que são as várias técnicas capazes de analisar os fenômenos comportamentais e psíquicos dos pacientes”. Já o psiquiatra atua em “ uma especialidade da medicina que lida com a prevenção, atendimento, diagnóstico, tratamento e reabilitação das diferentes formas de sofrimento mentais, sejam orgânicos ou funcionais, ou manifestações psicológicas severas”. Os tratamentos psiquiátricos envolvem “terapias medicamentosas e/ou prática psicoterápica” – conclui.

Fabrício também pondera sobre os tipos de tratamentos que podem ser utilizados para tratar cada um dos tipos de transtornos. “Na medicina, nem nunca e nem sempre. Portanto, nem sempre iremos tratar com medicamentos, porém nem nunca vamos tratar. Sabemos que em alguns casos, o acompanhamento psicoterápico é de suma importância”. Ele explica que cada caso é um caso, e o médico é a única pessoa que pode analisar o quadro do paciente para descobrir qual a melhor solução para aquele diagnóstico.

“Assim como o cardiologista trata pressão alta, o endocrinologista trata diabetes, o psiquiatra trata dos casos de ansiedade ou depressão, por exemplo”, assinala Fabrício. 

Além disso, em muitos casos o acompanhamento psicoterápico (oferecido por psicólogos), é de suma importância – alerta o médico. Assim, tanto os psicólogos, como os psiquiatras têm papéis importantes para o tratamento e diminuição do sofrimento mental das pessoas que possuem transtornos mentais.

Criminalização da psicofobia

Por conta deste tipo de discriminação foi criado um projeto de lei para criminalizar atitudes preconceituosas e discriminatórias contra os deficientes e os portadores transtornos mentais (PLS 236/2012 de autoria do senador e médico Paulo Davim/PV). O projeto de lei partiu da inciativa da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) em parceria com diversas entidades, chamada “A Sociedade Contra o Preconceito” objetivando combater todos os tipos preconceito seja ele racial, religioso ou de gênero.

Acerca do projeto a psicóloga Priscila acredita que este não seja o caminho. Ela defende que parte do preconceito com relação ao assunto, é resultado da falta de informação, que é decorrente da falta de discussão sobre o assunto. “A população precisa de orientação e não de punição!”. Para ela, os profissionais da saúde e da educação precisam de uma formação adequada para informação e diagnóstico, além de estarem preparados para atender públicos com diferentes níveis de conhecimento. Já Ednéia acredita que a PL seria um dos caminhos, pois existe uma falha na educação brasileira tanto no âmbito familiar, como escolar e “não há investimento que proporcione e facilite o direito e o respeito às pessoas consideradas diferentes”.

Fabrício assinala a importância do diálogo e principalmente do acesso à informação para combater o preconceito. Ednéa complementa dizendo que o ideal seria a criação de uma política pública nacional que envolvessem

“campanhas, orientações educacionais, investimentos na saúde mental e na educação, estruturas físicas e profissionais de atendimento integrado e interdisciplinares em maior número e locais para a demanda existente”.

Ela também destaca a importância de projetos voltados para a família, com foco na inserção dos familiares como parte integrante e participativa do tratamento.

Gritos de socorro

Para nossos entrevistados, a maioria das soluções propostas giram em torno da conscientização e educação. Julia Santos* defende que a principal medida deveria acontecer no ambiente escolar. Ela acredita que “quando uma pessoa tem acesso a um conhecimento sobre determinado assunto, as chances dela se tornar intolerante são baixas”. “Deveriam introduzir aos alunos aulas educativas sobre a existência de transtornos mentais, além de alertar os pais sobre isso e incluir palestras educativas para os mesmos e principalmente ter um apoio de psicólogos nas escolas para os alunos”.

Maria Martin*, 24 anos, concorda com o posicionamento de Julia. Para ela é tudo questão de informação. No ambiente da igreja que frequenta, os poucos que foram intolerantes, com o conhecimento sobre seu quadro mental mudaram sua forma de agir, o mesmo aconteceu em sua família. “O problema é que não podemos esperar um caso na família para pararmos de ser ignorantes. A saúde mental deve ser ensinada nas escolas assim como as doenças da população (sarampo, malária, dengue, etc) são. Tanto como prevenção, como para erradicar o preconceito” – defende.

Já Vitória Soares, pensa que falta empatia com as pessoas que sofrem com algum transtorno mental. Ela acredita que a solução é que as pessoas passem a “enxergar os transtorno mentais como doenças tratáveis que vão aparecer na vida de qualquer pessoa, inevitavelmente, em algum ponto da vida”. Também sobre isso, a psicóloga Marcele observa que “o preconceito cega as pessoas e não permitem que elas enxerguem além do que querem ver”. Sônia Alves*, propõe que os tratamentos não sejam “sejam individualizantes e vitimizantes, mas que integrem a rede de relações do indivíduo em sofrimento possam construir pilares para modelos de relação sem psicofobia”.

Lucia Amaro*, 24 anos, acredita que o segredo da questão é na aceitação das diferenças. “Se as famílias conseguissem enxergar e aceitar que não possui filhas ou netas perfeitas, seria um bom começo. E que não é culpa de ninguém, mas é responsabilidade delas dar suporte psicológico para as vítimas dessas doenças tão terríveis e marginalizadas perante a sociedade”.

“Está tudo bem não ser perfeito, não estar feliz todos os dias ou satisfeito com a vida ou com sua existência. A sociedade precisa parar de forçar uma saúde inexistente goela abaixo” – defende Lucia Amaro.

Um alerta a todos

Em nosso levantamento, dos 32 participantes, 78% eram mulheres, a maioria dos 18 aos 24 anos. Do total dos entrevistados, cerca de 53% já fizeram ou fazem algum tipo de tratamento. Destes, 56% se classificaram como bissexuais. Setembro também é o mês da visibilidade bissexual. Um estudo publicado em 2015, no “Journal of Public Health”, classificou as mulheres bissexuais como mais propensas a sofrer de problemas da saúde mental, especificamente 26% tendem a desenvolver quadros depressivos do que mulheres lésbicas.

Dos homens entrevistados, poucas foram as respostas com profundidade. Isso não quer dizer que homens não sejam afetados por transtornos mentais. Segundo a OMS, o número de homens que tira a própria vida, no mundo, é o triplo do número de mulheres. São 16.8 mortes a cada 100 mil pessoas no primeiro grupo, diante 5,2 no segundo. No Brasil, com base em dados do Centro de Valorização da Vida (CVV) de 2017,  a porcentagem é de 78,6% para 21,9%.

O mês de Setembro é marcado por reflexões acerca do preconceito e tabus que levam a situações de desamparo cuja a única saída do sujeito é abrir mão da própria vida. Os preconceitos da sociedade estão diretamente ligados a este desamparo, sejam eles de qualquer ordem. O acolhimento do outro e a aceitação das diferenças é fundamental para uma sociedade feliz, saudável e integrada. A educação e a conscientização nas suas diversas formas são as mais poderosas armas contra a ignorância.

Na próxima reportagem, falaremos um pouco mais sobre o Setembro Amarelo, com o foco no suicídio, e nas formas de prevenção e diminuição destes índices.

*Os nomes dos entrevistados foram preservados e trocados por nomes fictícios. Os diagnósticos também foram preservados para não diminuir a riqueza de seus relatos, reduzindo-os as seus transtornos.

Imagem de capa: Pixabay

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Redação

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