Nutricionista dá dicas para quem pretende começar a criar novos hábitos sem ter que deixar o prazer à mesa de lado
Por Marina Borges e Luís Ricardo
O atual cenário promovido pela pandemia do novo coronavírus não deixa dúvidas acerca do momento delicado pelo qual estamos passando. O isolamento social, adotado como forma de prevenção à Covid-19, pode causar depressão e outros transtornos mentais, com isso, muitas pessoas acabam descontando suas frustrações na comida.
No entanto, a quarentena pode ser uma oportunidade para se dedicar a hábitos mais saudáveis. Partindo desse princípio e tendo como prioridade uma alimentação que não deixe de levar prazer à mesa, a reeducação alimentar é uma ótima opção para adotar medidas benéficas à saúde.
Legenda: Uma refeição com variedade nutritiva é fundamental para estabelecer uma relação saudável com a alimentação (Foto: Pixabay)
De acordo com a nutricionista Thais Campista, reeducação alimentar significa (re)avaliar, (re)organizar e mudar hábitos ou comportamentos alimentares a fim de aprender a se alimentar de forma suficiente, tendo em mente o contexto e a situação de cada indivíduo.
Dessa forma, é possível respeitar seus limites de fome e saciedade e criar uma relação positiva, flexível e confortável com a comida. “Para isso, não basta aumentar o conhecimento das pessoas sobre alimentação e nutrição. A reconstrução do entendimento sobre ‘o que é comer saudável’ é perceber que alimentação saudável é, na verdade, ‘comer normal’”, explica.
Ou seja, reeducar-se alimentarmente é ser capaz de começar a comer quando sentir fome e parar quando sentir saciedade. Além disso, a reeducação alimentar exige a escolha de alimentos nutritivos, ou seja, você escolhe o que gosta e aproveita tanto os nutrientes quanto o sabor de forma suficiente.
“Para além das questões físicas, é necessário ser flexível e se permitir comer por razões não fisiológicas em alguns momentos e até exagerar sem razão em outros, confiando que seu corpo vai conseguir corrigir os pequenos ‘erros’ da sua alimentação. Afinal, errar faz parte do processo natural de comer”, ressalta a nutricionista.
Hoje, comemos de forma automática, com a qualidade e quantidade que nos agradam. De acordo com Thais, quando nos damos conta da necessidade de mudanças na alimentação, seja por autopercepção ou retorno de algum parente, amigo ou médico, começamos a observar melhor o que comemos numa “tomada de consciência” e buscamos mudar comportamentos e criar novos hábitos.
“Se essa mudança promover bem-estar e os objetivos forem alcançados, o novo comportamento passa a ser repetido e, assim, poderá ser mantido a médio e longo prazo. Isso é reeducação alimentar. E lembre-se: ela depende de se sentir bem comendo”, frisa a profissional.
Antes de tudo, Thais Campista recomenda que se busque a orientação de um profissional da área para que, juntos, entendam como se processam as suas escolhas em relação à comida (optar por um alimento em detrimento de outros em cada momento do seu dia, por exemplo).
Embora cada pessoa trace um caminho diferente no processo de reeducação alimentar, há algumas orientações comuns que podem ser incorporadas na rotina de quem pretende começar um processo de adoção de novos hábitos saudáveis. Confira as recomendações da nutricionista:
1. Planeje-se para cozinhar sua comida com mais frequência
Dessa forma, você evita o consumo de alimentos ultraprocessados, como as comidas servidas nos fast-foods. Visando consumir a menor quantidade possível de produtos industrializados, uma boa opção é investir no consumo diário de frutas, verduras e legumes;
2. Controle o consumo de açúcares
Isso inclui diminuir também o consumo de adoçantes. Reacostume o seu paladar a apreciar o salgado, o azedo e o amargo. Nosso paladar é super adaptável, mas foi massacrado por anos pela indústria alimentícia com diversos tipos de açúcares escondidos nos alimentos ultraprocessados. Com isso, a maioria de nós infelizmente nem reconhece mais os demais sabores como naturais;
3. Hidrate-se de forma suficiente
Beba pelo menos trinta mililitros por quilo de peso corporal. Água com ou sem gás, pura ou saborizada, todas hidratam e não use bebidas adocicadas como sucos, chás adoçados ou refrigerantes para saciar a sua sede;
4. Coma em horários regulares, com atenção plena
Além disso, respeite os primeiros sinais de fome, mastigando devagar, saboreando o alimento e parando quando perceber os primeiros sinais de saciedade. Ou seja, ouça a voz do seu corpo (suas necessidades reais); essa é a base de qualquer reeducação alimentar.
Legenda: Atente-se ao cronograma das refeições. Coma em horários regulares, respeitando os primeiros sinais de fome e os primeiros sinais de saciedade (Foto: iStock Getty Images)
Lembrando que o primeiro passo para mudar de atitude em relação à comida é prestar atenção e entender o porquê das suas escolhas alimentares. “Receita e prescrição não mudam sozinhas o comportamento alimentar; é preciso ter um acompanhamento profissional com escuta ativa, respeitosa e acolhedora para que as mudanças sejam permanentes”, destaca Thais.
Prazer é uma necessidade fisiológica básica e imprescindível para o atual cenário global em que o mundo se encontra. Pela primeira vez, nossa geração está enfrentando um vírus que exige distanciamento social. Essa situação pode gerar medo, ansiedade e insegurança frente ao inesperado.
Tendo isso em vista, nesse contexto da pandemia, Thais destaca que o prazer obtido na mesa, junto de pessoas amadas, pode ser de grande importância e ajuda na manutenção da saúde e do equilíbrio emocional.
“A conexão entre comida, emoções e comportamentos é muito forte e complexa. O alimento não tem somente a função de nutrir o corpo, ele também proporciona emoções, como prazer. Quanto mais prazer sentimos, mais satisfeitos ficamos”, ressalta a nutricionista.
No dia a dia, o ambiente agradável (e isso inclui desde a decoração e música até a companhia) também influencia nossa satisfação. Segundo a profissional, o objetivo da ação de comer não deve contemplar apenas a satisfação das necessidades físicas, mas preencher também as lacunas emocionais e socioculturais, o que inclui ficar feliz e satisfeito com o que, onde e como se comeu.
Entretanto, se o prazer gerado no ato de comer for usado de forma descontrolada, pode trazer prejuízos à saúde física e mental. “Quando a comida é utilizada para preencher vazios emocionais ou reduzir o medo e a ansiedade, estabelece-se uma relação de desequilíbrio. Dessa forma, aqueles que aprendem a se alimentar por essas razões são motivados a comer sempre que as experimenta, independente de maior fome ou apetite”, aponta Thais Campista.
Legenda: Quando a comida é utilizada para lidar com questões emocionais, o apetite sentido não corresponde a uma necessidade fisiológica (Foto: Reprodução/CPB Educacional)
Esse fenômeno é chamado de fome emocional e é caracterizado pelo não entendimento acerca dos diferentes tipos de fome. Diante disso, é preciso entender que a comida não conserta nem resolve essas angústias, apenas distrai, anestesia ou muda o nosso foco.
Além disso, a longo prazo, a fome emocional pode resultar em ganho de peso, diminuição da autoestima e até mesmo acarretar problemas clínicos. “Ao perceber que a sua busca por comida não está associada à fome física, pare, respire e identifique o que está sentindo, questionando-se sobre o que você realmente precisa para aliviar tal sensação”, indica a nutricionista.
Além disso, Thais recomenda que se crie alternativas à procura da comida por razões emocionais buscando outras atividades que também gerem prazer e relaxamento, como dançar, escrever, pintar, cuidar de uma horta, brincar com um pet, meditar ou conversar com amigos.
“Busque ser gentil com você mesmo durante seu processo de mudanças. Quando não conseguir evitar um erro na alimentação, como o comer emocional, observe toda a situação como um aprendizado e não como uma falha. Reeducação alimentar é um processo longo, cheio de obstáculos e precisa de suporte social, familiar e profissional. É importante contar com um nutricionista especializado para traçar esse caminho com você, afinal, sozinho é muito mais difícil”, enfatiza a profissional.
Legenda: Um sono reparador faz toda a diferença para o funcionamento do organismo (Foto: Pexels)
Mudar a rotina alimentar requer um pouco de tempo e atenção, mas pode ser um ótimo momento para incorporar outros novos hábitos que só vão ajudar nessa busca por um estilo de vida mais saudável. Thais ressalta que, para se reeducar alimentarmente, a adoção de comportamentos como a prática de exercícios físicos e uma boa noite de sono é fundamental.
Thais Campista ainda ressalta a importância de não se restringir demais em relação à alimentação. Segundo ela, o importante é se alimentar em quantidades suficientes e em equilíbrio ao longo do dia. O que deve ser evitado é o consumo desenfreado em razão de ansiedade, cansaço, irritação, tédio ou estresse, ainda mais em um momento de isolamento social.
Inserindo a atividade física na rotina
A reeducação alimentar, quando atrelada à atividade física, só traz benefícios. Pensando nisso, o profissional de educação física Guilherme Ledesma montou treinos para quem busca se manter ativo na quarentena. Vale destacar que os treinos podem ser feitos tanto por iniciantes quanto por pessoas mais experientes na prática de exercícios físicos.
A seguir, confira os circuitos montados para três dias de atividades físicas alternadas:
Legenda: O passo a passo do primeiro treino montado pelo personal trainer Guilherme Ledesma (Foto: Reprodução/Marina Borges)
Legenda: O passo a passo do segundo treino montado pelo personal trainer Guilherme Ledesma (Foto: Reprodução/Marina Borges)
Legenda: O passo a passo do terceiro treino montado pelo personal trainer Guilherme Ledesma (Foto: Reprodução/Marina Borges)
De acordo com Ledesma, é importante descansar um minuto entre um circuito e outro, repetindo cinco vezes cada um. “Na terceira repetição, o praticante pode descansar mais para recuperar o fôlego e se hidratar. Nos dois últimos circuitos, se possível, indico a redução do tempo de descanso para 30 segundos. Vale ressaltar que cada um tem seu tempo de adaptação, então os exercícios e seus respectivos tempos podem ser modificados a fim de garantir que a atividade seja executada sem causar danos, promovendo o bem-estar físico e mental do praticante”, conclui o personal trainer.