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Suborno e corrupção de alta performance no esporte

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A prisão de 7 dirigentes da FIFA trouxe à superfície as ilegalidades no futebol

Por Priscila Belasco e Thais Daniel
Em 27 de maio de 2015, o maior escândalo de corrupção no futebol veio à tona. Na Suíça, 7 pessoas foram presas [1] em um hotel em Zurique acusadas dos crimes de lavagem de dinheiro, crime organizado e fraude eletrônica. Entre os acusados, José Maria Marín, vice-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Ele e mais seis dirigentes da FIFA estavam reunidos para o encontro anual da entidade e foram acusados de controlar esquema que movimentava cerca de R$ 470 milhões em propinas.

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José Maria Marín. Reprodução


 
O episódio trouxe (reforçou) para o debate público a corrupção no futebol e no esporte em geral, que está cercado de polêmicas envolvendo vendas de jogos; doping dos atletas; ocultação de doping, aliciamento de árbitros; jogadores e treinadores e outros escândalos envolvendo o dinheiro público. Isso acontece porque o esporte tornou-se espetáculo e negócio milionário, com corrupção nas competições e na gestão.
Mas, como combater essa corrupção? Para o cientista norte-americano Roger Pielke [2], é necessário que haja uma mudança estrutural nas entidades esportivas. Sobre a FIFA, para ele a solução é que ela se comporte como uma empresa privada e esteja sujeita às mesma leis e fiscalizações do mundo corporativo. “A Fifa tem característica de uma grande empresa, mas não joga por essas regras. Se fosse uma companhia multinacional, teria de seguir diferentes regras, mas isso não acontece porque querem passar a imagem da instituição sem fins lucrativos. Se você olha a quantidade de dinheiro que circula no futebol, acreditar nisso é risível”, afirma o cientista.
É realmente risível se considerarmos o valor de 1,4 bilhão de dólares [3] que a entidade arrecadou em 2013 com a venda de direito de transmissões de imagem e patrocínio ou os 2,15 bilhões de dólares que serão usados na Copa do Mundo da Rússia, em 2018. Com essa quantidade de dinheiro, não fiscalizar a movimentação dele é fazer vista grossa à corrupção e assegurar a manutenção de esquemas corruptos. É preciso dar transparência às atividades e o passo inicial pode ser respondendo à pergunta de quanto ganha o presidente da FIFA ou o porquê dos cartolas da entidade terem aumentado em 100% seus salários [4] para comparecerem às reuniões bimestrais em Zurique.
Mas, como era de se esperar, a corrupção no esporte não é uma polêmica recente; ela existe há pelo menos 2,8 mil anos, com início na Grécia [5]. Do lado de fora do local onde aconteciam as antigas Olimpíadas, encontrava-se ruínas de estátuas; essas estátuas eram patrocinadas por atletas e técnicos pegos trapaceando nos jogos.
O que acontece é que, nos dias atuais, a globalização, por meio da internet, tem causado um fenômeno muito maior do que na antiga Grécia. Hoje, as apostas podem acontecer em todos os continentes e pessoas da Ásia, continente que tem o maior mercado de apostas, podem influenciar na manipulação de pequenos jogos da América, por exemplo.
As apostas são feitas em sites que são hospedados em países, ou cidades, que não têm leis adequadas para esse tipo de aposta, como Malta, Ilhas Virgens e Londres. As apostas são proibidas no Brasil, mas não impede que as pessoas acessem a esses sites. Em países, como os Estados Unidos, os sites não podem ser acessados. Nesses sites, pessoas do mundo inteiro podem apostar em partidas brasileiras, por exemplo.
A maior parte das manipulações é feita através de um intermediário que, a mando dos grandes apostadores, são responsáveis por aliciar árbitros, jogadores e treinadores para ajudarem nas manipulações das partidas. Os aliciadores, na maioria das vezes, são os responsáveis pelo pagamento e por fazerem ameaças e chantagens aos manipulados, para que o esquema não seja divulgado às autoridades.
Apostam-se em todas as posições de jogadores e em todos os tipos de jogadas, até em cobranças de laterais e também de acordo com a posição dos times nas tabelas dos campeonatos. Os gols valem mais. Somente em 2015, esse mercado movimentou cerca de 4,8 trilhões de reais pelo mundo afora.
Existem diversos tipos de apostas: tripla / dupla, half time / full time, under / over, ao vivo, a longo prazo, marcador de gol, handicaps e resultado exato.
A combinação perfeita para a fácil manipulação de jogos, de acordo com o GloboEsporte.com é: pouca visibilidade das competições, baixos salários, falta de fiscalização preventiva e possibilidade de corrupção de autoridades.
Recentemente, em Julho de 2016, tivemos um escândalo no Brasil envolvendo de manipulação de resultados de jogos envolvendo times menos conhecidos e de campeonatos inferiores, como as séries A2, A3 e B de campeonatos estaduais no país, além de torneios de base. A operação, que ficou conhecida como “Game Over”, expediu dez mandados de prisão e mais dois de busca e apreensão.
Em 2013, a Europol (polícia da União Europeia) desvendou um dos maiores escândalos no Continente. O inquérito durou cerca de 18 meses até ser finalizado e envolveu 30 países como: Alemanha, Finlândia, Hungria, Eslovênia e Áustria. Foram analisadas 680 partidas, cerca 13 mil e-mails; identificados 425 suspeitos; obtidos 50 mandados de busca; e 50 pessoas presas.
Os casos são vários e chocam o mundo toda vez que algum novo esquema é revelado. A pergunta que surge é: como evitar a corrupção no futebol e a manipulação de resultados de jogos? Teria alguma receita pronta para esse problema?
O fato é que já é sabido que é da cultura humana apostar. Uma das soluções seria a formulação de um programa preventivo e educador com atletas, técnicos e diretorias de clubes, para alertar os prejuízos que a manipulação de partidas podem causar tanto para o esporte, como para a vida da pessoa (caso ela perca dinheiro ou seja descoberta, por exemplo).
Para Simon Chadwick, professor da Universidade de Coventry, onde comanda o Centro Internacional para Negócios do Esporte, os torcedores também são cúmplices na corrupção no esporte. Confira trechos da entrevista dada à BBC Brasil, em 8/11/2012:
BBC Brasil – Historicamente, grandes eventos envolvem mau uso de dinheiro?
Chadwick – Grandes eventos esportivos têm um péssimo histórico, e há muito ceticismo em torno de grandes arenas, que muitas vezes não deixam um legado. Londres-2012 foi interessante, porque muitas arenas serão desmontadas.
O mais importante é a extensão da corrupção relacionada à escolha de locais e construção de arenas. Vejamos o que aconteceu neste ano na Ucrânia, que gastou 10 bilhões de libras para sediar a Eurocopa, o mesmo que Londres gastou nos Jogos Olímpicos, que são tradicionalmente mais caros. A Ucrânia construiu quatro estádios para 10 ou 15 partidas, despertando pedidos de investigação – acredita-se que, se custaram tanto, só pode ter havido corrupção.
Em Manaus, vocês terão um estádio enorme que não ficará cheio. Em termos de prestígio, pode ser algo bom. Mas em termos econômicos, é uma péssima decisão.
O que tende a acontecer é que os países se candidatam (a grandes eventos) e só depois pensam nos problemas que isso vai causar. Mas muito antes você tem que saber por que está se candidatando e quais as consequências de ganhar.
BBC Brasil – Tivemos escândalos recentes em grandes federações, mas estas parecem ter mudado pouco. É verdadeira essa percepção?
Chadwick – Isso ilustra um problema maior no esporte global. Basta olhar a Fifa para entender a amplitude disso. Obviamente (o presidente Joseph) Blatter fez alguns movimentos de mudança (após denúncias de propina). Só que a vasta maioria dos observadores segue preocupada com a governança e a corrupção nesse tipo de organização.
Mas precisa haver um esforço de pressão global contra a corrupção. Porque se (organizações esportivas) podem pressionar governos para favorecer patrocinadores (por exemplo, pedindo mudanças de lei no Brasil), podem fazer o mesmo para promover transparência e governança. No caso específico da Fifa, eles falharam.
A não ser que se lide com isso globalmente de forma séria, em organizações grandes como a Fifa e a Federação Internacional de Automobilismo, será difícil mudar a cultura em organizações domésticas.
Casos de escândalos
2016 – Operação Game Over (Brasil)
No mais recente escândalo da futebol, resultou em diversas prisões no Rio de Janeiro, São Paulo e Ceará, pela Polícia Civil. Para isso, foram analisados por meio de grampos telefônicos e relatórios sigilosos de empresas. As investigações envolviam uma quadrilha internacional, que subornava técnicos e jogadores brasileiros para manipular resultados de jogos e lucrar em casas de apostas asiáticas e europeias. Foram descobertas manipulações em 6 partidas entre 2013 e 2016: Sorocaba 0 x 9 Santo André (Campeonato Paulista Sub-20, em 2015); Audax 3 x 0 Duquecaixiense (Copa Rio, em 2015); Rio Preto 4 x 0 Barueri (Campeonato Paulista Série A3, em 2016); Botafogo 4 x 0 Quissamã (Campeonato Carioca, em 2013); Vasco 3 x 1 Quissamã (Campeonato Carioca, em 2013); Itapipoca 4 x 0 Icasa (Campeonato Cearense, em 2016).
2013 – Europa
Em fevereiro de 2013, a Europol, polícia europeia, juntamente com as polícias da Alemanha, Hungria, Eslovênia, Finlândia e Áustria, desmantelou uma quadrilha que teria manipulado cerca de 380 partidas de futebol. A rede de apostas tinha base em Singapura e fraudava resultados de jogos, na sua grande maioria, na Alemanha, Turquia e Suíça, além de partidas na América Latina, África e Ásia; envolvendo até mesmo jogos da Liga dos Campeões e das Eliminatórias para a Copa do Mundo. Uma das maiores, senão a maior, operação de casos de manipulação de resultados desvendou que as apostas chegavam a 100.000 euros, resultando em um lucro total de aproximadamente 8 milhões de euros para a quadrilha. Na época, Ralf Mutschke, ex-diretor da Interpol, chegou a dizer que nenhum campeonato do mundo estava a salvo da corrupção.
2009 – Europa
Em novembro de 2009, um escândalo de apostas irregulares e manipulação de resultados de partidas de futebol abalou a UEFA (União das Federações Europeias de Futebol). Cerca de 200 jogos disputados, no ano, em nove países (Alemanha, Áustria, Bélgica, Bósnia-Herzegóvina, Croácia, Eslovênia, Hungria, Suíça e Turquia) foram investigados. Entre eles, jogos da Liga dos Campeões e da Liga Europa (Antiga Copa da UEFA), dois dos torneios interclubes mais importantes do continente europeu. Em torno de 200 pessoas estavam envolvidas em subornar jogadores, árbitros, técnicos e dirigentes. 17 suspeitos foram presos na Alemanha (15) e na Suíça (2).
2006 – Serie A (Itália)
O escândalo, descoberto em maio de 2016, envolveu grandes times da Serie A, o Campeonato Italiano da primeira divisão. Juventus, Milan, Fiorentina, Lazio e Reggina foram acusados de manipular resultados influenciando na escalação de árbitros “comprados”, que lhes favoreciam nas partidas. Dentre as provas, foram divulgadas conversas por telefone do então presidente da Juventus, Luciano Moggi, propondo o esquema. O escândalo resultou na cassação dos títulos italianos de 2005 e 2006, conquistados pela Juventus, sendo a mesma rebaixada para a segunda divisão do campeonato; Milan, Fiorentina, Lazio e Reggina continuaram na Serie A, mas com pontuações negativas; 19 dirigentes e árbitros foram suspensos de três meses a cinco anos do futebol (entre eles Luciano Moggi, dirigente da Juventus, e Adriano Galiani, dirigente do Milan).
2005 – Máfia do Apito (Brasil)
O caso, denunciado em outubro de 2005, envolveu o árbitro Edílson Pereira de Carvalho, que, de acordo com investigações, beneficiava empresários que apostavam dinheiro em resultados das partidas da primeira divisão do Campeonato Brasileiro em sites na internet. Foi divulgado que o ex-árbitro ganhava de R$ 10 mil a R$ 15 mil por partida. Estima-se que o lucro da quadrilha tenha passado de R$ 1 milhão. Um outro árbitro, José Paulo Danelon, que apitava jogos da Série B do brasileiro, também é acusado de envolvimento na máfia. Edílson foi banido do esporte; José Paulo ficou proibido de apitar jogos; o empresário Nagib Fayad, acusado de ser o responsável pelo esquema, foi preso; e os 11 jogos apitados por Edílson no campeonato foram anulados e jogados novamente.
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Edílson Pereira de Carvalho. Reprodução


2005 – Caso Robert Hoyzer (Alemanha)
O árbitro alemão confessou ter manipulado 13 jogos da Copa da Alemanha e das segunda e terceira divisões da Bundesliga de 2004. Ele tinha contato com apostadores croatas e estima-se que o esquema tenha envolvido cerca de 2 milhões de euros. Como punição, Hoyzer pegou 2 anos e meio de prisão e foi banido do futebol.
1997 – Caso Ivens Mendes (Brasil)
O escândalo, denunciado em maio de 1997, divulgou um esquema de corrupção dentro da CBF. Foram divulgadas conversas por telefone do então presidente da Comissão de Arbitragem da CBF, Ivens Mendes. Em uma dessas conversas, o ex-presidente pedia R$ 25 mil para o presidente do Atlético Paranaense, Mario Celso Petraglia, para que o clube fosse beneficiado em uma partida da Copa do Brasil. Em outra ligação, Ivens aparece oferecendo ajuda ao Corinthians para o então presidente, Alberto Dualib, em troca de R$ 100 mil. As quantias seriam para financiar a campanha para deputado federal de Ivens, nas eleições de 1998. Ivens Mendes pediu afastamento de seu cargo; o Atlético-PR foi punido com a perda de 5 pontos no Campeonato Brasileiro de 1997; Petraglia e Dualib foram proibidos de representar seus clubes perante a CBF.
1980 e 1986 – Calcio (Itália)
O escândalo foi descoberto em março de 1980 e envolveu grandes times da Serie A (Milan, Lazio, Perugia, Bologna e Avellino) e também times da Serie B do Campeonato Italiano (Taranto e Palermo). O caso consistia na venda de resultado das partidas em troca de dinheiro. Milan e Lazio foram rebaixados para a Serie B; Avellino, Bologna, perugia, Palermo e Taranto continuaram em suas seguintes divisões, mas com cinco pontos negativos; o presidente do Milan, Felice Colombo, foi banido do futebol; Tommaso Fabretti, então presidente do Bologna, foi suspenso por um ano do esporte; 18 jogadores foram punidos com suspensões que variaram de 3 meses a 6 anos (entre eles, Paolo Rossi, atacante da seleção italiana).
Seis anos após o escândalo de 1980, um novo caso abalou o futebol do país. A manipulação de resultados de partidas em troca de dinheiro dessa vez envolveram nove clubes das Séries A, B, C1 e C2 do Campeonato Italiano (Lanerossi Vicenza, Perugia, Cavese, Udinese, Cagliari, Lazio, Triestina, Palermo e Foggia). O Lanerossi Vicenza foi excluído da Serie A; Perugia e Cavese foram rebaixados para a quarta divisão; todos os outros seis times perderam pontos; 17 dirigentes e treinadores e mais 34 jogadores foram punidos com suspensões que variaram de um mês a cinco anos.
1915 – Premiere League (Inglaterra)
Em uma partida entre Manchester United e Liverpool, no dia 02 de abril de 1915, válida pelo Campeonato Inglês, jogadores dos dois clubes armaram o resultado. O Manchester lutava contra o rebaixamento e o Liverpool estava no meio da tabela. A partida encerrou em 2 x 0 para os Red Devils. Após a partida começaram a surgir denúncias de que havia dinheiro envolvido em apostas por aquele resultado. A Federação Inglesa descobriu que sete atletas estavam envolvidos no escândalo e os puniu, banindo-os do futebol; os dois times não foram punidos, pois a federação concluiu que somente os jogadores estavam envolvidos no esquema; Manchester acabou não sendo rebaixado por conta dos 3 pontos ganhos naquela partida.
 
 
 
[1] José Maria Marin está entre dirigentes da Fifa presos na Suíça. http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/05/150527_prisoes_suica_mdb
[2] Para cientista político, Fifa necessita de mudanças estruturais. http://www1.folha.uol.com.br/esporte/2015/06/1636207-para-o-cientista-politico-fifa-necessita-de-mudancas-estruturais.shtml
[3] De onde vem o dinheiro da FIFA. http://exame.abril.com.br/negocios/de-onde-vem-o-dinheiro-da-fifa/
[4] Cartolas da FIFA decidem dobrar seus salários. http://esportes.estadao.com.br/noticias/futebol,cartolas-da-fifa-decidem-dobrar-seus-salarios,1516329
[5] Como a manipulação de resultados está destruindo o futebol.
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2013/02/130205_futebol_manipulacao_analise_ac.shtml
 

Redação

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