Esse ano, a população irlandesa foi às urnas para votar se as leis em relação ao aborto deveriam mudar. No dia 25 de maio de 2018, 70% votou a favor da legalização do aborto para mulheres com até 12 semanas de gestação. Mesmo essa sendo uma questão que envolva o direito de escolha da mulher, há muito preconceito e conservadorismo envolvidos nas discussões. E isso não acontece só nesse exemplo: as mulheres enfrentam inúmeras dificuldades quando o assunto é o seu próprio direito, seja em relação a decidir sobre seu próprio corpo, ter acesso à educação, receber oportunidades semelhantes aos homens na área profissional ou até mesmo a garantia de que não terão suas vivências e destino traçados por conta do seu sexo.
Além de toda a dificuldade de assegurar o direito da mulher por conta da cultura machista pregada na maior parte dos países, ainda há o obstáculo dentro do meio legislativo, já que a maioria dos governantes são homens que têm seus próprios interesses . E estes quase sempre reforçam a ideia de que o espaço político não é para mulheres. Fatores que são intensificados em maior ou menor grau de acordo com a cultura de cada lugar. “A violência contra as mulheres tem várias causas e a cultura é uma das que mais influenciam, assim como a questão histórica também”, explica a socióloga Marília Martins.
O corpo feminino tem que lidar com inúmeras situações que o corpo masculino não tem. Assédio em vias públicas, possibilidade de estupro e sexualização da figura feminina são só alguns dos obstáculos a serem enfrentados por todas. E, para além da questão cultural segundo a qual a mulher tem função de “saciar” o homem, deve-se levar em conta o âmbito religioso – que aumenta o estereótipo desse ser submisso que deve servir o homem. “Cada país tem sua maneira de entender a si mesmo, tem uma questão geográfica, histórica e seu próprio jeito de entender as coisas. E, além disso, existe a religião, que é um fator decisivo para que muitas coisas deem errado quando se trata dos direitos humanos das mulheres”, completa a socióloga.
Ou seja, além da questão cultural, que em certos continentes pode se considerar semelhantes, há a atuação da religião, que implica na dificuldade da mulher exercer a liberdade do seu próprio corpo. No Oriente Médio, por exemplo, muitas mulheres têm seu acesso à educação limitado. Malala é um símbolo dessa luta: a paquistanesa foi baleada na região natal do vale do Swat na província de Khyber Pakhtunkhwa, onde os talibãs locais impedem as jovens de frequentar a escola
Diante disso, podemos compreender que, embora exista particularidades em cada cultura, há uma dificuldade para encarar a emancipação da mulher em relação aos temas que se relacionam com os direitos do seu próprio corpo e suas próprias decisões, mesmo nos países mais desenvolvidos e avançados, como é o caso da Irlanda, que só conseguiu garantir o direito do aborto agora em 2018. Em relação a isso, o Brasil ainda esbarra em questões religiosas, já que o procedimento só é legalizado em caso de abuso sexual, má formação do feto ou risco de vida à mulher. Esse também é o caso da Argentina e era a situação do Chile, antes do país legalizar o aborto em agosto do ano passado. Dentre os países que têm a situação legal, encontramos a Rússia, a China, a África do Sul, a França e os Estados Unidos, onde as leis variam de acordo com cada estado.
Tal circunstância só evidencia que os problemas das mulheres são amplos, já que sua capacidade de escolha é colocada em dúvida a todo momento. A mulher teve uma grande dificuldade de conquistar seu espaço ao longo da história e, por conta disso, algumas medidas sociais ainda são a saída para diminuir os resquícios do machismo e de todo o preconceito enfrentado. “As políticas públicas e os movimentos sociais são uma saída para equilibrar a situação quando ela não é contemplada pela legislação”, explica Marília Martins.
Entre as iniciativas que tentam assegurar o direito e o espaço das mulheres, merece destaque a ONU Mulheres, que tem atuado em diferentes países com o intuito de amenizar a desigualdade de gênero e empoderar mulheres. A entidade da Organização das Nações Unidas foi criada em 2010 e, desde então, vem atuando com ações humanitárias, desenvolvimento econômico, liderança e participação política e segurança da mulher ao redor do mundo.
Além disso, outra iniciativa do terceiro setor é a campanha Por Ser Meninas, da Plan International. A Organização Não-Governamental tem o intuito de dar oportunidade de estudo para meninas através da conscientização do seu entorno familiar, assim, há a implementação da ideia de que as garotas devem ter o direito de estudo tanto quanto os meninos, que, em sua maioria, não têm obrigações domésticas que atrapalhem o seu desenvolvimento escolar. A campanha é executada no Brasil, mas a ONG possui diferentes ações em diversos países.
Dessa forma, podemos compreender que, assim como o início de toda essa questão histórico-cultural, precisamos, também, de um novo processo histórico-social para amenizar a desigualdade de gênero existente. Por enquanto, ações de coletivos feministas, grupos de mulheres e iniciativas do terceiro setor têm feito a diferença para amparar e conscientizar mulheres que estão em busca do seu espaço e do seu direito.