Como brasileiros estão lidando com o covid-19 no exterior
Por Lucas Gervazio
Que o ano de 2020 vem, até então, trazendo consigo traços de imprevisibilidade — muito por conta da pandemia do novo coronavírus — , todos já sabemos. Lidar com essa situação inusitada de isolamento social mexe com a rotina e, a partir disso, um “efeito dominó” se configura: reorganização, saúde mental e readaptação ao que muitos hoje já chamam de “novo normal” são necessários nesse momento.
Todas essas incertezas em meio a um quadro triste, com um elevado número de óbitos ao redor do mundo por conta da gripe, nos abalam. Ter que lidar com esse panorama já é complicado; fora do seu país de origem, longe de sua família e amigos próximos, parece ser um desafio maior ainda: é a situação de brasileiros que estão em meio à pandemia no exterior.
Ana Beatriz Belletti, 22, foi para a França em 2018 após conseguir uma bolsa de intercâmbio para continuar sua graduação de Engenharia Química pela Universidade Federal de Uberlândia, vislumbrando um duplo diploma. Se formou pela École Nationale Supériure de Chimie de Lille, em Lille, e no atual momento está concluindo seu segundo estágio obrigatório, agora na cidade de Metz, para que volte ao Brasil ainda este ano. “Quando soube da pandemia, minha ficha demorou um pouco para cair”, relata Ana Beatriz, “porque eu tinha começado o meu estágio fazia duas semanas, cidade nova, novo ambiente de trabalho”.
Para Felipe Yuji, 21, que está morando em Nagoya, Japão, há quase um ano, a preocupação ao ficou mais por conta de familiares e amigos no Brasil. “Aqui, com minha namorada, eu até fiquei tranquilo, não houve muito desespero. Minha preocupação maior era com meus familiares e amigos no Brasil, pensando em como chegaria o vírus lá”.
Felipe, de descendência nipônica, foi para o Japão trabalhar. Em meio a todo esse momento, ainda sofre com o desemprego recente, junto com a namorada. “Nessa onda de demissão massiva que está acontecendo por aqui, os estrangeiros são os primeiros da fila. Eu e minha namorada acabamos sofrendo na pele o impacto desse momento”
Nesse cenário de desemprego, um momento especial para o casal: Maria Beatriz Sei, 21, namorada de Felipe, está grávida de 5 meses. Com a família de Maria também no Japão, eles têm um apoio familiar por perto nesse momento, mas a pandemia traz medidas especiais para a gravidez. “Separaram, aqui em Nagoya, um hospital somente para maternidades, com muita burocracia para as consultas”, relata Felipe. “Não pode entrar ninguém com ela na consulta e eles recomendam que a gestante evite sair, com uma maior precaução”, conclui.
Nova rotina e orientações dos governos locais
A partir das orientações de distanciamento social — com o intuito de reduzir o número de contágio pelo vírus — , uma nova rotina se fez necessária. Ficar em casa por um tempo tão longo nos obriga a formular novas práticas diárias. Essa foi uma das dificuldades nessa quarentena para Ana Beatriz. “Eu ficava no mesmo ambiente, o dia todo, tendo que me adaptar a trabalhar, ter lazer e descansar no mesmo quadrado, porque onde moro o espaço é bem pequeno e apertado”, diz.
Em cada país, a pandemia trouxe fatores específicos que fizeram os governantes locais lidarem com essa crise da saúde de diferentes maneiras. No Japão, a clareza nas instruções passadas aos cidadãos foi um fator positivo durante a pandemia. “A população daqui sabe lidar muito bem com as notícias oficiais e não houve muitos problemas quanto a isso”, relata Felipe. Entretanto, uma situação inusitada durante as primeiras semanas de quarentena aconteceu por lá: “No começo do surto, começou a rolar boatos por aqui de que o papel higiênico era produto essencial para essa crise. Chegou um momento em que não se encontrava papel higiênico em nenhum lugar de Nagoya.”
A divisão do território francês em áreas por níveis de gravidade da pandemia auxiliou muito a compreensão sobre a conjuntura do país diante da situação. “Eles dividiram o país em zonas vermelhas, laranjas e verdes, de acordo com o número de casos”, diz Ana Beatriz, que já está vivenciando a fase de desconfinamento em Metz: “Na minha região estamos na segunda fase de desconfinamento; Paris ainda está em zona laranja, não podendo abrir bares, restaurantes, quase nada. O restante do país já está todo em zona verde.”
Vendo a situação do Brasil de longe
“Aqui, na França, a gente só conseguiu desconfinar com medidas severas para não superlotar os leitos hospitalares e, então, a partir do momento que a situação ficou mais controlada foi quando começamos a sair do confinamento”. Ana também comenta sobre as medidas adotadas no Brasil e o descumprimento das indicações por parte de muitos, agravando a situação no país. “Acompanhando as notícias no Brasil, como sempre faço, fico aflita vendo o panorama atual. De longe, não consigo prever quando isso pode normalizar por lá, (…) se todo mundo continua a vida normalmente, vai demorar para acabar.”
De fato, é espantoso o tratamento da situação por parte de alguns governantes no país. O Brasil já conta com mais de 1,6 milhão de casos confirmados até o momento — e estudos que indicam a possibilidade desse número ser até 8 vezes maior por conta da falta de realização de testes — e regiões com os leitos de UTI já ou quase em estado de lotação.
Entretanto, a esperança por dias melhores é o que nos move. “O sentimento de liberdade, poder sair, respirar o ar lá fora”, que relata Ana, ao vivenciar o desconfinamento na França, é a sensação que esperamos vivenciar, em breve, aqui também no Brasil. Em momentos como esse, a união e a consciência coletiva pode nos guiar para um futuro esperançoso com a pandemia controlada.
Apoio do Itamaraty
Na tentativa de administrar essa situação de pandemia com brasileiros fora do país, o portal consular do Ministério das Relações Exteriores divulgou, em seu website, um edital com orientações para brasileiros no exterior afetados pela pandemia do Covid-19. No portal do Itamaraty também é possível encontrar informações sobre medidas de restrição de circulação determinados pelo governo local no exterior, voos de volta para o Brasil, medidas de apoio aos brasileiros no exterior e contatos dos agentes consulares brasileiros.