Redobrar a atenção durante o verão é necessário: tempestades, descargas elétricas e doenças são sinais de alerta.
Por Pedro Cardoso
21 de dezembro. Começa oficialmente a estação mais quente do ano no hemisfério sul. O verão. Aquela época do ano prazerosa, em que grande parte das pessoas está em férias. É o momento de começar a se programar para as festas de fim de ano; passar alguns dias na praia, se hospedar num resort, aproveitar um parque aquático, ou mesmo, encontrar qualquer lugar em que haja uma piscina para se refrescar do calor escaldante. Juntamente com a primavera, o verão marca a transição da estação seca (outono e inverno) para a estação chuvosa. A chuva, obviamente, é uma dádiva da natureza. Sem ela, plantações não se desenvolveriam, florestas se tornariam desertos, rios e mananciais secariam, consequentemente, não haveria sistemas de abastecimento de água. Em suma: não haveria nenhum tipo de vida na Terra. O fato é que as chuvas não são o problema, mas o modo como lidamos com ela.
A técnica do Centro de Meteorologia de Bauru (IPMET), Zildene Pedrosa, aponta que a estação de verão é caracterizada, basicamente, por dias mais longos que as noites. “Ocorrem mudanças rápidas nas condições diárias do tempo, levando à ocorrência de chuvas de curta duração e forte intensidade, principalmente no período da tarde”, conta a meteorologista. E, devido ao aumento da temperatura do ar sobre o continente, estas chuvas são acompanhadas por trovoadas e rajadas de vento.
Mas, a despeito de todas essas informações, por que é chuva ainda é grande causadora de desastres naturais no planeta Terra? A resposta é simples: o despreparo do ser humano. Professor de Geografia da UNESP em Rio Claro, Antonio Tavares relata que a infra-estrutura urbana é totalmente despreparada para a lidar com o excesso de chuvas característicos dos meses de dezembro à março. Segundo ele, o desafio principal é encontrar alternativas para evitar a impermeabilização do solo e o assoreamento dos rios (acúmulo de detritos que causa a redução da profundidade e da vazão), além de maiores investimentos em escoadores de água (como as bocas de lobo).
Afinal de contas, reduzir o volume de chuvas não é possível, nem desejável (haja vista que, até pouco tempo atrás, a cidade de São Paulo sofria com a crise de abastecimento de água por conta do baixíssimo volume d’água da represa Cantareira, que abastece a capital do estado de São Paulo e cidades próximas).
Raios: luz de alerta
Definitivamente o Brasil é o país dos raios e morar aqui é conviver com o risco iminente dos acidentes que ocorrem com muita frequência. Dos 3,15 bilhões de raios que caem na durante um ano, cerca de 100 milhões deles vêm desabar em terras brasileiras. O número, divulgado no ano passado por uma equipe de cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), em São José dos Campos, São Paulo, não é superado por nenhum outro país. E ficou bem acima das estimativas que davam conta de 30 milhões ao ano.
De acordo com o estudante de física Fernando Gomes Silveira, os raios são formados pelas gotículas de água que sobem acima das nuvens e se transformam em partículas de gelo, que se agitam (batendo umas nas outras) provocando atrito que as deixa carregada eletricamente. “Quando as partículas ficam muito carregadas, elas não aguentam mais ‘segurar’ a energia e formam-se os raios”, explica.
Mas, afinal, como se formam as faíscas vistas no horizonte quando se anuncia uma tempestade? Relâmpagos são gerados dentro de uma nuvem muito particular: a cumulonimbo, que se diferencia das outras por ser verticalmente mais extensa. Ela se forma a 2 quilômetros de altura do solo e se estende até 18 quilômetros acima.
Silveira conta que o perigo não vem somente do céu, mas vem de baixo também – é o efeito conhecido como descarga conectante, que ocorre em ambientes abertos da seguinte forma: toda vez que um raio vem em direção à terra, quando está a cerca de 200 metros do chão, uma outra corrente vinda do solo, sai em sua direção. Se alguém estiver próximo a esta corrente que sai do chão, ela o usará como “conector” e passará por meio da pessoa. Em alguns casos o raio que vem das nuvens é atraído por um pára-raios e diminui os danos à pessoa que recebeu a descarga. Caso contrário, as chances de sobreviver são baixíssimas.
Proliferação de doenças
Outro aspecto relacionado ao excesso de chuvas diz respeito às doenças. Os casos de leptospirose, hepatite A e esquistossomose, por exemplo, aumentam drasticamente nesta época do ano, uma vez que os alagamentos e o acúmulo de lixo e urina de animais, como ratos, além da presença de fezes humanas com vírus e bactérias, estão diretamente ligados à isso. Doenças cujo vetores são mosquitos, como malária, dengue e, inclusive, a tão comentada febre zika, também apresentam altas taxas de incidência risco na estação das chuvas, já que as larvas desse mosquitos se desenvolvem em ambientes úmidos e quentes.
De janeiro até novembro do ano passado, foram identificados 1 milhão e meio de casos de dengue no país. Em relação ao ano de 2014, o aumento foi de – pasmém – 176%, quando foram catalogados cerca de 555 mil casos da doença. Nesse período, a região Sudeste apresentou 63,6% do total de casos (975.505), seguida das regiões Nordeste (278.945 casos), Centro-Oeste (198.555 casos), Sul (51.784 casos) e Norte (30.143 casos).
Segundo o Ministério da Saúde, 199 municípios brasileiros estão em situação de risco de surto de dengue, chikungunya e zika. Outros 665 municípios estão em situação de alerta (quando 1% a 3,9% dos imóveis têm focos do mosquito) e 928 em situação satisfatória (menos de 1% dos imóveis com focos).
Apenas na cidade de São Paulo, projeções técnicas estimam que, neste ano, há possibilidade do número de casos da dengue atingir a marca de duzentos mil, o dobro das ocorrências registradas no ano passado.
A bióloga Mirela Nunes explica que neste período de grande quantidade de chuvas, é esperado um crescimento no número de casos de doenças, sobretudo daquelas cujas larvas dos vetores se reproduzem em ambientes úmidos e quentes, característicos da atual estação, o verão.
Recentemente, a Agência Nacional de Saúde (Anvisa) liberou a vacina contra a dengue, a DengVax. Por enquanto, o governo federal ainda estuda a possibilidade de oferecer a vacina no sistema público de saúde. Mirela ressalta que vacina só protege contra a dengue. E o mosquito aedes aegypti é também responsável pela transmissão de mais duas doenças, o zika vírus e a chikungunya. “Não basta tomar a vacina contra a dengue. O modo mais eficaz de reduzir as taxas de infectados é por meio da prevenção”, alerta a bióloga. Ou seja, é aquela história que as pessoas estão cansadas de ouvir, mas que ainda não surtiu o efeito prático necessário – tampar caixas d’água, colocar terra nos vasos de flores, atentar para objetos e pontos de acúmulo de água, como pneus, dentre outras medidas, que, por negligência, acabam sendo deixadas de lado. Não à toa, os sábios já diziam: “melhor prevenir do que remediar”.