Apesar de compor a maioria da população brasileira, elas ocupam apenas 14% do cenário político brasileiro
De acordo com a legislação brasileira, o direito ao voto chegou até as mulheres em 1932, com o Decreto nº 21.076, e se consolidou com a Constituição de 1934. Enquanto o voto era obrigatório para os homens alfabetizados, o código eleitoral previa, em seu artigo 121 que “os homens maiores de sessenta anos e as mulheres em qualquer idade podem isentar-se de qualquer obrigação ou serviço de natureza eleitoral”. Na prática, as mulheres poderiam votar caso fossem autorizadas por seus pais ou maridos. Atualmente, o abismo entre as leis e a realidade continua e ainda marca presença na luta feminina.
Foi apenas em 1965 que os direitos (e obrigações) eleitorais dos homens e mulheres se tornaram igualitários. Antes disso, a Constituição de 1946 tornou o voto obrigatório para mulheres que exerciam atividades remuneradas. Aquelas que não recebessem salário ou trabalhassem com registro, não possuíam o mesmo direito.
De acordo com o levantamento realizado pelo Projeto Mulheres Inspiradoras, o Brasil assume a 161ª posição de um ranking de 186 países em relação à representatividade feminina no poder executivo. Dos 186 países ranqueados, atualmente apenas 17 possuem mulheres como chefes de governo, ou seja, aproximadamente 92% da população mundial é governada por homens. O Projeto chegou a essas conclusões por meio de dados fornecidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pela ONU e pelo Banco Mundial.
No Brasil, desde a Proclamação da República, dos 35 presidentes, apenas uma foi mulher. Hoje, na Câmara dos Deputados, de 513 eleitos, apenas 54 são mulheres. No Senado, há13 mulheres entre os 81 representantes. Em todo o Brasil, apenas 12% dos municípios elegeram mulheres para governar em 2016.
De acordo com Bia Cardoso, 37 anos, pedagoga e uma das coordenadoras do Blogueiras Feministas, a jornada dupla não só sobrecarrega a mulher, como também impede que ela possa pensar numa carreira política. Daí a necessidade de dividir todo o trabalho físico e emocional a ela encarregado. Além disso, há também a questão do machismo. Segundo a pedagoga, é “um ambiente pesado e envolto em muitas disputas, que não abre espaço para quem está começando”.
“O assassinato de Marielle Franco, por exemplo, é muito assustador se analisarmos as questões de gênero ali. Uma mulher negra que veio da periferia e que vinha fazendo seu trabalho foi brutalmente executada numa ação planejada e articulada da qual dificilmente saberemos quem são os reais mandantes. É um balde de água fria nas mulheres que estavam pensando em entrar na carreira política e tentar algo. Por isso, há uma luta muito grande para não deixarmos que o medo nos domine”, explica a coordenadora do Blogueiras Feministas.
Segundo Bia, a maioria das pautas importantes para o gênero feminino já foram levadas ao Congresso, mas geralmente da maneira errada. “Atualmente, quando elas estão arquivadas é até bom. Pautas extremamente conservadoras que pretendem proibir o aborto de qualquer forma estão ganhando cada vez mais força. Um exemplo disso foi a votação do aborto em casos de anencefalia que ocorreu no STF em 2012. Grupos conservadores fizeram muito barulho, chegaram a levar bebês com outras doenças para a mídia dizendo que aquelas crianças tinham anencefalia, mas a decisão foi favorável e a população não se revoltou porque entendeu a necessidade, entenderam o que é uma mulher ter que carregar por nove meses uma criança que vai nascer e viver pouquíssimo tempo e ter que lidar com um pós-parto e um luto ao mesmo tempo.”
Juliana Escossia, 38 anos, funcionária pública, não se sente representada no Congresso brasileiro.
“Se tivéssemos mais representantes políticas mulheres, as leis seriam voltadas para nossa realidade”, explica. De acordo com ela, a mulher fica sempre a um passo atrás do homem no que diz respeito não só a questões como segurança, mas também desigualdade de direitos, como, por exemplo, a diferença salarial.
Aos 18 anos, Juliana se filou ao Partido dos Trabalhadores (PT) por acreditar em suas ideologias e querer lutar por elas. Hoje, mais afastada da política, revela se envergonhar. “Nós, mulheres, temos sim que nos unirmos e lutarmos por aquilo que acreditamos, temos que lutar por nossos direitos que são infringidos e negligenciados. Não podemos nos calar”, afirma.
Giulia Peruch, 14 anos, estudante e futura eleitora, espera que o Brasil se torne um país com igualdade de direitos. “Uma política balanceada, em que as mulheres tenham mais voz e mais chances dentro dos meios políticos. Que as necessidades de todas as pessoas sejam atendidas por pessoas que as representam e não por aqueles que não vivem a mesma realidade”, explica.
Em 2009, o Supremo Tribunal Federal (STE) instituiu que a cota de que 30% dos candidatos de um partido deveriam, obrigatoriamente, ser mulheres. Mas, a lei foi tratada de maneira burocrática, ou seja, para não serem punidos, os partidos colocam as chamadas “candidatas fantasmas”, que apesar de se candidatarem, não recebem fundo partidário, não têm uma campanha eleitoral real. O que prova isso é o fato de que 86% das candidatas mulheres não tiveram nenhum voto – nem elas votaram nelas mesmas.