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Nuvem de agrotóxico

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O que pode acontecer se uma nuvem de inseticida cair sobre as áreas urbanas para tentar eliminar o mosquito da dengue?

Por: Daniel Linhares e Raphael Soares

O presidente Michel Temer sancionou um Projeto de Lei 13.301, de 27 de junho de 2016, para adotar medidas de vigilância contra o mosquito Aedes aegypti e contra as principais doenças decorrentes dele: a dengue, o zika e a chikungunya. Com o elevado número de casos em 2016, 802.249 casos prováveis de dengue, 91.387 casos prováveis zika e 39.017 casos prováveis de chikungunya, dados do Ministério da Saúde em abril, a medida tem como principal alternativa a pulverização de agrotóxicos em áreas urbanas com o uso de aviões, método usado em lavouras e na agropecuária.

Embora a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, a Abrasco (Associação Brasileira de saúde coletiva), o Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional), o Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde), o Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde), a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), o próprio Ministério da Saúde e tantas outras instituições tenham se posicionado contra, a lei está em vigor e preocupa pelas consequências  do contato das pessoas com as substâncias químicas dos agrotóxicos.

O uso de agrotóxicos é um assunto polêmico e muito pouco aprofundado. Afinal, as pesquisas começaram a serem feitas há pouco tempo. Pouco tempo, pois é um período insuficiente para análise das consequências a longo prazo. A questão da produção de alimentos é essencial para a população, já que é direito de todos saber quais substâncias estão em seus alimentos. Além de saber se essas substâncias não lhe causaram problemas mais tarde.
Outro ponto é a discussões sobre a legitimidade de diversos compostos usados em agrotóxicos, uma vez que muitos testes são realizados em períodos considerados curtos por alguns pesquisadores. Por outro lado, esses testes são determinados por orgãos regulamentadores do país, dando o aval institucional para sua comercialização.

Problemas no uso urbano

Tania Marques, pós-graduada em Direito Ambiental pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e com análises  em torno da necessidade de pesquisas para vacinas contra o Aedes aegypti, como prevenção para que não houvesse epidemias  como as  que estão acontecendo atualmente, observa tal postura preventiva como incoerente. “ O inciso quarto do parágrafo terceiro do artigo primeiro da lei 13.301 de 27 de junho de 2016 a qual autoriza mecanismos de controle vetorial como aeronaves pulverizando agrotóxicos sobre as cidades é realmente absurdo”.
Tania também relata uma experiência pessoal. “Morei 3 anos no Rio de Janeiro e olhava para aquele caminhão que soltava o fumacê contra a dengue  e me sentia numa guerra. Se tiverem aviões pulverizando agrotóxicos sobre nossas cabeças nas cidades, vamos nos sentir sendo bombardeados por produtos tóxicos causadores de câncer . Seria terrível, com certeza não podemos deixar acontecer a pulverização aérea por agrotóxicos. Existem outras formas de combater estas doenças.”
Esse “fumacê”, como é chamado popularmente, é o processo de nebulização pesada (UBV). Ele é feito por máquinas de pulverização acopladas em veículos que vão percorrendo a cidade. A recomendação para a população é deixar portas e janelas abertas, para facilitar a ventilação. No entanto, também orienta que pessoas alérgicas ou acamadas fiquem em um cômodo isolado durante o processo.

A ABRASCO criticou a proposta em como é danoso para a saúde o contato com o veneno dos inseticidas usado neste tipo de combate. “Elevado potencial de causas graves de doenças nos seres humanos, extinção de espécies e perdas econômicas “. Aqui percebemos outros riscos, não só humanos mas também ambientais na fauna e na flora urbana, mesmo que sejam menores dentro das cidades seu sistema existe e faz parte do complexo metropolitano.

Em nota técnica publicada no portal GGN, sanitaristas e pesquisadores da ABRASCO, afirmam que “É preciso também problematizar o uso de produtos químicos numa escala que desconsidera as vulnerabilidades biológicas e socioambientais de pessoas e comunidades.”. Além disso, existe a questão da legalidade da medida. Afinal, é permitido a pulverização de substâncias em áreas de concentração populacional? Marcelo Firpo, da ABRASCO, disse em entrevista para a Agência Brasil que essa lei é “inconstitucional e ilegal”.
Firpo argumenta que apesar de não ter menções sobre aplicações aeroagrícolas em áreas povoadas, existe uma instrução normativa do Ministério da Agricultura proibindo essas aplicações. “Não é permitida a aplicação aérea de agrotóxicos em áreas situadas a uma distância mínima de: a) quinhentos metros de povoações, cidades, vilas, bairros, de mananciais de captação de água para abastecimento de população; b) duzentos e cinqüenta metros de mananciais de água, moradias isoladas e agrupamentos de animais;”

Em esclarecimento publicado pelo Ministério da Saúde do próprio governo Temer adverte das complicações geradas. “No que se refere especificamente aos riscos para a saúde humana, o Instituto Nacional do Câncer (INCA), por exemplo, já alertou a sociedade brasileira para o fato de que, considerando o potencial cancerígeno (em longo prazo) e intoxicante (em curto prazo), a atitude mais adequada é não utilizar agrotóxicos”. Destacou, ainda, que proteções individuais ou barreiras locais não impedem que a substância atinja lençóis freáticos e atue em áreas muito distantes da original.

O uso contínuo dos venenos gera desequilíbrios ambientais com o aumento na resistência das pragas e o surgimento de novas. ”Além dos danos à saúde, deve-se mencionar que as pragas agrícolas possuem capacidade de desenvolver resistência aos agrotóxicos aplicados, que dessa forma, perdem gradativamente sua eficácia, levando os agricultores a aumentar as doses aplicadas e/ou recorrer a novos produtos”. Já é observado este problema nas áreas agrícolas com o surgimento de insetos e plantas que invadem e interferem no sistemas de outras e nas que deveriam ser protegidas. Caso tal fenômeno aconteça nas regiões urbanas haverá grande número de contaminados, como já ocorre nas áreas agrícolas com os moradores dos arredores e dos funcionários que estão manuseando os agrotóxicos.

Um exemplo ocorreu entre outubro e dezembro de 1995 em Kingston na Jamaica, na qual foi utilizado a pulverização de inseticida para controlar o surto de Aedes aegypti. Foi proposto a ação para reduzir rapidamente a população do mosquito, porém a medida não surtiu efeito suficiente. “Os resultados deste estudo demonstraram claramente que a intervenção do inseticida se mostrou ineficaz na interferência da atividade de ovoposição do Aedes aegypti

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), entre os países em desenvolvimento, os agrotóxicos causam todos os anos, 70.000 intoxicações agudas e crônicas. 

Retrocesso em medidas ambientais

Embora o Brasil seja um dos países com que mais se destaca em medidas ambientais para a preservação, contra o desmatamento e por usos que renovem de produção, ele peca nas lavouras com o crescente uso dos agrotóxicos. Por mais que haja benefícios com sua aplicação para o controle de pragas que podem se manifestar, há restrições quanto a quantidade e as substâncias dentro deles. Desde 2008, o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking mundial de consumo de agrotóxicos e entre eles o mais usado na agricultura é o glifosato, substância que acaba de ser associada ao surgimento de câncer, segundo um estudo publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O glifosato é um potente herbicida, tanto que nas plantações em que é usado, em muitos casos, as plantas são modificadas geneticamente para serem resistentes ao agrotóxico e não comprometam a lavoura, além disso, causa também grandes danos ao solo, o que gera menos rendimento do solo e seu consequente desgaste a longo prazo.

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Mesmo que agências como a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) publiquem pesquisas sobre a toxicidade de certas substâncias há a barreira econômica envolvida, o que impede seu banimento imediato do mercado. Ainda que a Justiça  suspenda a produção dessas substâncias nocivas a saúde ela só irá sair de circulação após o final do estoque de seu fabricante.

Na política brasileira, o agronegócio tem grande força. Segundo o blog “Congresso em Foco” do portal UOL, a bancada ruralista conta com 207 deputados. Dentre eles é possível encontrar grandes latifundiários, donos de boa parte da produção agrícola brasileira. Um recuo nas vendas de agrotóxicos, assim como o desenvolvimento de pesquisas sobre o tema se tornam então “problemas” para eles.
Para a Abrasco, na mesma nota técnica publicada no portal GGN, “O consumo de tais substâncias pela Saúde Pública só interessa aos seus produtores e comerciantes desses venenos. São insumos produzidos por um cartel de negócios muito lucrativo, que atua em todo o mundo e que, mesmo com evidências dos riscos provocados pelos organofosforados e piretroides, dos quais se conhecem tantos efeitos deletérios, têm tido o apoio de agências internacionais de Saúde Pública, como o Fundo Rotatório da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) e da Organização Mundial da Saúde (OMS).”

Tania Marques afirma que houve uma redução no últimos anos de agrotóxicos no país, mas que a pressão da bancada ruralista é um grande empecilho na prática agrícola. “No momento que o Brasil conseguiu reduzir em 20% o uso dos agrotóxicos na agricultura acredito que seria uma regressão ao meio ambiente brasileiro”. Lembrando que também  há uma influência dos produtores desses bioquímicos e das relações com outras indústrias transgênicas na própria modificação genética de plantas e sementes. Um exemplo recente foi a fusão entre dois gigantes da indústria química Bayer e Monsanto, a nova companhia será a maior do ramo de insumos agrícolas do mundo.

Mega mercado

A alemã Bayer possui umas dos maiores catálogos de inseticidas, herbicidas e fungicidas do mercado. Já a norte-americana Monsanto produz tanto sementes convencionais e transgênicas, além de também produz um herbicida a base de glifosato. A união entre essa duas empresas acarreta num maior acesso a sementes, incluindo as transgênicas por parte da Bayer e para a Monsanto um acervo complementar de agroquímicos.
A união ainda não tem todos os seus aspectos analisados. Afinal, com essa união as chances de um monopólio no setor são grandes. Rui Prado, presidente da Famato (Federação da Agricultura do Estado de Mato Grosso) disse em entrevista para a Folha de S. Paulo que “a história mostra que essas uniões sempre resultam em aumento de preços para o produtor e, por consequência, para o consumidor final”

Tais uniões de empresas desse ramo facilitam as transações entre seus produtos e diminuindo os custos por parte deles, porém ao reduzir o custo de produção de itens diferentes quando se trata de uma mesma companhia – a chamada economia de escopo –, a empresa ganha também ao vendê-los para o mesmo cliente por meio de supostas facilidades. Em decorrência, os produtores rurais compram sementes e agroquímicos com o pensamento de redução de custos, no entanto os preços que supostamente estariam abaixo da tabela são embutidos no preço de agrotóxicos. Visto que o uso de sementes transgênicas estão em alta e seu rendimento é elevado na questão de produção de alimentos, eles também necessitam de maiores usos de agrotóxicos, o que a longo prazo reduz sua eficácia e necessita em mais uso de agroquímicos. Um ciclo que gera mais custos, mais químicos e mais riscos para a saúde do consumidor e do produtor que está em contato direto com a produção.

“ Desde 2008, quando o Brasil se transformou no maior consumidor de agrotóxicos, são despejados nas lavouras brasileiras o equivalente a 5,2 litros de agrotóxicos por pessoa ao ano”, dados do Dossiê da ABRASCO.

BENEFÍCIOS DOS TRANSGÊNICOS AGRÍCOLAS

DESVANTAGENS DOS TRANSGÊNICOS NA AGRICULTURA

  • Resistência a pragas e doenças
  • Aumento da produtividade
  • Redução de custos
  • Diminuição do uso de pesticidas, herbicidas e defensivos
  • Maior tolerância à condições ambientais e climáticas
  • Introdução de características novas à espécie a partir da alteração do genoma
  • Geração de anticorpos nessas espécies transgênicas
  • Como os transgênicos são plantados em monoculturas, eles trazem uma perda da biodiversidade
  • Alguns genes da planta podem ser transferidos para outras espécies, a partir do fluxo gênico (ou escape gênico) modificando parentes silvestres
  • Pode ocorrer o surgimento das chamadas super pragas, que são resistentes a pesticidas e herbicidas
  • Plantas mais resistentes e agressivas podem gerar o extermínio de insetos benéficos à agricultura

As vantagens  estão diretamente ligados à produtividade enquanto as desvantagens então tanto nos fatores ambientais quanto nos humanos, estes que englobam: a alteração da quantidade de nutrientes pode interferir na absorção de alimentos; aumento de alergias pela transferência de genes de uma espécie para a outra; pode ocorrer a transferência de genes resistentes a antibióticos para bactérias presentes no intestino humano e no dos animais, através do escape gênico, e um dos mais alarmantes é que ainda não existem estudos conclusivos com relação aos efeitos à longo prazo.

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Mas que já consta de doenças relacionadas aos agrotóxicos no meio rural podemos citar efeitos crônicos que podem ocorrer meses, anos ou até décadas após a exposição, manifestando-se em várias fatores como cânceres, má-formações congênitas, distúrbios endócrinos, neurológicos e mentais. Também há relatos de intoxicação por leite materno em crianças por contato da mãe com os efeitos intoxicantes.

Em documentário realizado pela Secretária de Saúde de Mato Grosso, Terra Firme e VideoSaúde retrata os problemas do uso em excesso dos agrotóxicos na região de Mato Grosso com foco nas consequências do uso desses no ambiente, especialmente, na saúde do trabalhadores.


Os agrotóxicos se mostram uma solução dúbia, em que o problema da produção de alimentos pode ser aparentemente resolvido, mas por fim prejudica seriamente a pessoas. Afinal, não restam muitas opções para a população, já que a única alternativa seria preferência por produtos orgânicos. Contudo, esses produtos costumam ser mais caros que o restante, dificultando portanto seu acesso às classes mais pobres da sociedade. Para ajudar o consumidor o  Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) identificou, numa etapa inicial, a existência de 140 feiras orgânicas distribuídas em 22 capitais brasileiras. O Idec deu continuidade ao levantamento e hoje disponibiliza o Mapa de Feiras Orgânicas e Grupos de Consumo Responsável, instrumento que tem como um de seus principais objetivos tornar os produtos orgânicos mais acessíveis aos consumidores e fomentar uma alimentação saudável.
 As entidades responsáveis por sua regulação parecem pouco dispostas a transparência de seus métodos e resultados. O uso desse tipo de substância deveria ser mais comprometido com a saúde e bem-estar da população e não com as receitas das empresas que os vendem.

Redação

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