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Vamos falar sobre suicídio?

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A importância da informação no combate ao suicídio.
Por Larissa Borges e Lívia Reginato
 

O suicídio foi tratado como tabu por muito tempo, e ainda hoje, existe uma certa dose de preconceito que rodeia o assunto. Por conta disso, muitas vezes escolhe-se deixar a discussão do assunto de lado para evitar o desconforto. Porém, Luiz Antonio Silveira Ramos, coordenador do Centro de Valorização da Vida, CVV, de Bauru, ressalta que a falta de discussão em torno do assunto pode ser muito problemática. “Se você não fala, você não conhece o assunto. Se você não conhece o assunto, você não tem como ajudar a pessoa”, pondera. Ele acredita que somente a visibilidade do tema pode trazer bons resultados no combate ao suicídio.

Para auxiliar nesse debate foi criado o Setembro Amarelo, uma campanha brasileira de prevenção ao suicídio, iniciada em 2015. É uma iniciativa criada a partir de uma parceria entre o Centro de Valorização da Vida (CVV), com o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). O objetivo da campanha é promover discussões sobre o assunto como forma de prevenir os casos de suicídio. “Se a gente promover a discussão desse assunto, e muitas vezes a gente fala de não falar de suicídio, mas sim de prevenção, já é uma forma bastante eficaz de combater isso”, reflete Luiz. Além dessa campanha, o CVV realiza ações o ano inteiro, e dissemina a ideia de que é preciso combater o suicídio o ano todo. A psicóloga Priscila Meireles Guidugli reforça a importância da prevenção contínua e diz que “não podemos nos atentar aos casos de suicídio somente no setembro amarelo”.

Parte do tabu que ronda o assunto se deve ao medo. As pessoas não estão preparadas para lidar com o tema e, por isso, têm receio de abordar o assunto. Mas na realidade, a discussão do assunto pode tornar a população apta para lidar com as diversas situações que possam aparecer. E é justamente esse o objetivo das discussões que o CVV busca promover através das suas campanhas. “O que o CVV propõe hoje é uma abertura desse diálogo, promover essa discussão para que as pessoas saibam lidar com esse assunto”, explica Luiz.

Luiz lembra que geralmente alguém que pretende cometer suicídio apresenta alguns indícios. “A  gente sabe que de cada 10 casos de suicídio, 8 as pessoas deram sinais. Nem sempre a pessoa fala simplesmente ‘eu vou me matar’, mas a pessoa fala que quer sumir, que quer ficar livre dos problemas, que queria dormir e acordar só depois, que queria enfiar a cabeça num buraco e não ver mais nada”. Além disso, a fala não é o único aviso que o suicida pode dar. Mudanças de comportamento, isolamento, afastamento da família, perda do convívio social, entre outras situações, “tudo isso são sinais que a pessoa tá dando que ela não está bem”, e devem ser vistos como um alerta para aqueles que estão próximos.

Quem não está por dentro do tema, costuma relacionar o suicídio com problemas psicológicos como a depressão e os transtornos de personalidade, mas essa relação nem sempre acontece na realidade. A psicóloga Priscila Guidugli acredita que as pessoas que possuem esses diagnósticos são sim um grupo de maior risco, mas apesar disso, ela afirma que “é um erro achar que apenas pessoas com algum diagnóstico cometem suicídio”.

Quando alguém pensa em perguntar para outra pessoa: “você está pensando em suicídio?”, em seguida vem o medo da resposta afirmativa, e o assunto é deixado de lado. O medo da resposta afirmativa se deve à falta de preparo para lidar com o assunto e, também, à crença de que é necessário ter uma solução para esse problema antes de levantar a questão. Porém, Luiz afirma que “você não precisa ter uma solução pro problema dela, você não precisa resolver o problema dela, mas se você estiver com ela já é muita coisa”. Ele ressalta que muitas vezes a pessoa suicida não consegue ter forças para procurar ajuda para os seus problemas sozinha, “então se ela tiver alguém que esteja junto com ela disposto a fazer isso, quem sabe a gente pode salvar essa pessoa?”.

O tabu é construído também por causa do sentimento de vergonha que pode ser gerado ao trazer à tona o assunto. Por exemplo, em uma família em que um ente morreu por suicídio, internamente pode existir o sentimento de culpa e, perante às outras pessoas, pode existir o sentimento vergonha. Isso acontece porque ninguém gosta de admitir que um parente próximo se suicidou e que a família não conseguiu evitar que isso acontecesse. Mas, para Luiz, essas situações não precisam ser encaradas dessa forma. “Não precisa carregar essa culpa, você não sabia o que fazer, porque você não foi preparado para isso”, ele comenta.

 
O CVV

O Centro de Valorização da Vida (CVV), é uma organização sem fins lucrativos que visa combater o suicídio. O CVV realiza atividades de prevenção ao suicídio o ano todo, incluindo a promoção de eventos, palestras e discussões sobre temas relacionados à questão do suicídio. Porém, seu foco está nas atividades de atendimento ao público. Para isso, o principal canal de atendimento é via telefone, e quem está passando por problemas e pensa em suicídio, pode ligar para o número 188, e conversar com um dos atendentes do CVV. O número funciona 24 horas e a ligação é gratuita. Desde julho desse ano, o número passou a funcionar no país todo, e além desse canal, também existem os atendimentos via e-mail e via chat. Todos os atendimentos são anônimos, o que significa que quem entra em contato com o centro não precisa se identificar, e nem fica sabendo com quem está falando.

O posto de atendimento da cidade de Bauru trabalha das 7h às 23h, mas isso não significa que a população da cidade ficará sem atendimento nos demais horários. Como o número é internacional, você pode estar na cidade de Bauru, mas ser atendido por voluntários que estão trabalhando em qualquer parte do país. Consequentemente, o posto de atendimento de Bauru também não atende somente as ligações bauruenses. “É como se fosse um PABX nacional onde a pessoa vai ligar e ele vai ser direcionado para um próximo ramal que esteja desocupado no momento, então ele pode ser atendido por qualquer cidade do Brasil”, explica Luiz.

É importante ressaltar que o CVV é formado apenas de voluntários, pessoas que estão dispostas a doar um pouco do seu tempo para ouvir as outras. Não existe um trabalho profissional de psiquiatria ou psicologia ligado à organização. Portanto, o contato com o CVV não descarta a necessidade de buscar por uma ajuda profissional. “O CVV muitas vezes é o primeiro passo que a pessoa consegue se organizar um pouco, organizar os pensamentos, pra ela entender que ela precisa de uma ajuda profissional”, observa Luiz.

O contato com um voluntário do CVV também é uma forma de fazer com que o suicida se ouça e organize os seus pensamento. Luiz conta que durante os atendimentos, muitas vezes os voluntários mostram o que está sendo falado para quem está do outro lado da linha. Então é comum que o voluntário diga: “você está me dizendo que você vai tal coisa”, com o objetivo de fazer com que a pessoa se ouça e reflita sobre aquilo que ela mesmo disse. “É isso que a gente quer fazer, fazer com que ela raciocine, com que ela pense, com que ela se organize”, conta Luiz. O coordenador ressalta a importância desse procedimento, porque geralmente a pessoa que está pensando em suicídio está “bagunçada”, “mas muitas vezes, falando uma vez, duas, três, depende de cada um, ela organiza e ela começa a ver que o suicídio não é a melhor opção”.

Luiz ressalta que o CVV procura evitar qualquer tipo de situação que possa criar barreiras entre a organização e as pessoas que estão buscando ajuda. É por isso que não existe nenhum tipo de vínculo com nenhuma religião. “Se você vincula o CVV a alguma religião, católica, espírita, sei lá qual, a pessoa que não é daquela religião pode não se sentir à vontade em falar contigo”, ele afirma.

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Principais queixas

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 90% dos casos de suicídio estão relacionados a transtornos mentais, principalmente aos transtornos de humor, como a depressão. Porém, atualmente ainda existe um preconceito muito grande com esses diagnósticos e, consequentemente, uma banalização desses quadros. Por conta disso, muitas vezes as queixas de quem sofre com essas doenças não são levadas a sério, e por isso existe uma resistência na hora de procurar ajuda profissional. Então é possível notar que a psicofobia possui um papel importante nos casos de suicídio. A psicóloga Ednéa Morilla afirma que o preconceito pode “enfraquecer a busca pelo tratamento ou o tratamento em si”.

É por isso que é tão importante o apoio da família e dos amigos para aqueles que estão passando por essa situação. A psicóloga Marcele Vieira diz que “é de fundamental importância a ajuda e compreensão de familiares, amigos e sociedade. Quando paciente se sente acolhido e respeitado em sua dor a chance de melhora e recuperação são maiores”.

Luiz conta que no geral, as principais queixas testemunhadas pelos voluntários do CVV são sobre solidão e problemas familiares. Mas quando o assunto são os jovens, são citados com frequência os problemas de relacionamento com os pais, as principais questões relatadas por eles estão ligados à sexualidade e à carreira profissional. “Mas a grande maioria das pessoas são pessoas solitárias, pessoas que não tem com quem dividir os sentimentos que ela está passando naquele momento”, ele observa.

O coordenador também fala sobre a série da Netflix “Os 13 porquês”. A série foi lançada em 2017 e é uma adaptação do livro de Jay Asher (2007) de mesmo nome. Ela conta a história de Hanna, uma adolescente que se suicidou e deixou 13 fitas com gravações feitas por ela mesma contando quais foram os motivos que a levaram a se suicidar. Muito se discute sobre o papel da série na sociedade atual e as opiniões ficam divididas, entre aqueles que acreditam que a série teve um papel importante ao dar visibilidade ao assunto, e aqueles que acreditam que a série romantizou o assunto e pode servir como um gatilho para os jovens que se identificam com a personagem principal. “Se foi bem feita, ou se foi mal feita, se deveria ter sido assim ou assado, principalmente aquela cena do suicídio dela mesmo, que foi muito forte, a gente não tem uma posição sobre isso. O que a gente acha que foi benéfico e interessante é que se promoveu discussão. E muita gente que se via com aqueles problemas ligou para a gente, para conversar sobre aquilo”, opina Luiz.

Luiz relata que após o lançamento da primeira temporada da série, o número de adolescentes ligando para o CVV aumentou muito. Ele diz que antes disso, as pessoas que ligavam para o centro eram, em sua maioria, pessoas de mais idade. Então junto com a série “veio uma enxurrada de adolescentes ligando para a gente com todos aqueles problemas que a gente vê na série: o bullying, o assédio sexual, o abuso, enfim, tudo aquilo que apareceu na série o adolescente vive isso”. O coordenador conta que, como não era usual ligações que abordassem esses assuntos, os voluntários precisaram aprender a tratar os adolescentes que passaram a procurar ajuda. Luiz ainda ressalta que não é preciso se identificar ao entrar em contato com o CVV, mas que de acordo com os assunto abordados é possível perceber em qual fase da vida a pessoa está, dessa forma, foi possível notar o aumento no número de contatos feitos pelos adolescentes.

A dor de quem pensa em suicídio é muito grande. “Porque você imagina: quando a gente morre o que que acontece? Uns têm uma crença, outros tem outra, enfim, mas ninguém tem certeza absoluta do que vai acontecer com você a partir da morte”. E apesar da incerteza, os suicidas preferem arriscar “ir para um lugar que ela não sabe o que vai acontecer, do que ela ficar vivendo o que ela tá vivendo hoje”. Por conta disso, Luiz acredita que não se pode rotular as pessoas que pensam em suicídio.

“Então esses rótulos de corajoso, de covarde, isso daí tem que ser esquecido também. O que é coragem? O que é covardia? A gente não sabe o que a pessoa está passando.”

 
Como evitar o suicídio

A melhor forma de combater o suicídio é se informando sobre o assunto e estando próximo das pessoas que você ama para perceber os sinais. Muitas vezes a pessoa que pensa em suicídio dá vários sinais e até mesmo fala sobre a sua intenção, mas não é ouvida. “Vem aquele velho mito de que quem quer fazer não fica falando. Mas a gente sabe que não, a gente sabe que quem se mata fala que vai fazer. Ninguém acorda de manhã e se mata a tarde”, diz Luiz. Ele destaca que o suicídio é o resultado de um acúmulo de fatores, um acúmulo de problemas e sentimentos ruins, e num certo dia se dá mais uma ocorrência ruim e a pessoa se suicida. Mas na realidade, aquele fato não foi a causa do suicídio, foi só o gatilho final.

Luiz ressalta que é importante que os preconceitos em torno do assunto sejam deixados de lado. Os casos de suicídio podem ser combatidos com informação e empatia, e é isso que o CVV busca realizar. “O que a gente faz é levar informação, porque o grande problema disso tudo é a falta de informação, não saber como lidar com isso”, ele comenta. Para aqueles que convivem com alguém que está pensando em cometer suicídio, ele diz: “Estar junto, ouvir sem julgamentos”. E também ressalta a importância de deixar de lado os chavões como: “você precisa de Deus”, “eu já passei por isso e superei”, “isso não é nada”, “tem gente com problemas muito maiores que o seu”, “levanta a cabeça e vai lavar uma louça”, “vai procurar um trabalho, vai fazer alguma coisa de útil”, etc. Ele reforça a tese de que esse tipo de fala “não ajuda em nada. O que ajuda é a gente ser empático, a gente estar junto com a pessoa, se colocando no lugar dela”.

Outras ações também são importantes para evitar o suicídio. Algumas profissões possuem maior índice de mortes por suicídio justamente por conta da facilidade de acesso aos meios de realização. Por exemplo, os militares têm fácil acesso às armas, os médicos têm fácil acesso aos remédios e os agricultores têm fácil acesso aos venenos. Portanto, é necessário dificultar o acesso aos meios de cometer o suicídio.

Além disso, a mídia também tem um papel muito importante no combate ao suicídio. Luiz observa que existe diferença nos possíveis modos de retratar o suicídio na mídia. “Uma coisa é divulgar uma notícia de apoio e de ajuda, ou o serviço do CVV, outra coisa é só noticiar isso de alguma forma pra vender jornal”, ele pontua. Portanto, é essencial que o suicídio não seja apenas um fato noticiado, mas que seja também um assunto abordado em debates e discussões, e que sejam oferecidas opções de ajuda e orientação para aqueles que estão pensando em suicídio e para quem está próximo dessas pessoas.

A psicóloga Priscila também fala sobre isso e ressalta que é preciso que sejam realizadas ações que preparem a sociedade para lidar com o assunto e com os casos reais que podem vir a acontecer em qualquer lugar. “Os profissionais da saúde e da educação precisam de formação adequada, que forneça ferramentas apropriadas para informação e diagnóstico, além de aprenderem formas de comunicação adequadas para pessoas com diferentes níveis de conhecimento, não se atendo apenas a termos técnicos”. Então, todos os setores da sociedade precisam estar preparados para lidar com o suicídio.

E o mais importante, no momento em que os sinais da intenção de suicídio são percebidos é essencial buscar ajuda profissional. Apesar do medo que existe ao redor do assunto e da falta de uma solução imediata para a questão, Luiz dá um conselho, se você “não souber como resolver ter a humildade de dizer: ‘Eu não sei como resolver, mas eu estou junto contigo pra te ajudar. O que você quiser fazer eu posso te encaminhar, te ajudar, te levar’”.  


 

Luiz faz um convite. Aqueles que possuem disponibilidade para ajudar ainda mais nessa causa podem se tornar voluntários do CVV. “O que você precisa ter para ser voluntário do CVV? Saber ouvir”, ele pontua. Ele conta que o CVV é uma filosofia vida. “Só de você falar menos, ouvir mais, não julgar, respeitar, não dimensionar, e aceitar o que a pessoa está te falando, já é muita coisa. E você pode usar isso na tua vida, não é só dentro do CVV”.

Para quem tiver interesse em participar ou saber mais sobre o trabalho voluntário no CVV, mande um e-mail para: bauru@cvv.org.br.

E para quem pensa em suicídio e está buscando ajuda, ligue 188 ou acesse o site https://www.cvv.org.br/.

 

Redação

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